Israel busca solução após eleição terminar sem maioria
Partido do atual primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, ficou em segundo lugar no Parlamento israelense
Henrique Gimenes - 18/09/2019 15h03
Um dia depois das eleições parlamentares em Israel, que não coroaram um vencedor imediato, o país enfrenta uma espécie de ressaca política nesta quarta-feira (18), tentando decifrar o recado das urnas e, principalmente, prever os possíveis cenários políticos.
Com 99% das urnas apuradas, os resultados oficiais apontam que o partido de centro-esquerda Azul e Branco, do ex-comandante do exército Benny Gantz, foi o mais votado, com 32 das 120 cadeiras do Knesset (o Parlamento israelense).
Ele é seguido de perto pelo partido conservador Likud, do atual primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que conseguiu abocanhar 31 assentos. Nenhuma das duas forças políticas têm chance de formar uma coalizão com maioria no Knesset (61 cadeiras).
Diante do impasse, a fábrica de rumores e conjecturas políticas funciona com força máxima, enquanto analistas esperam os próximos passos dos jogadores. Netanyahu anunciou que não irá discursar, este ano, na Assembleia Geral da ONU justamente para resolver o imbróglio político.
Ele também convocou uma reunião de emergência entre o Likud e seus aliados de partidos religiosos e de direita radical. A decisão foi formar um bloco de direita único, com 55 cadeiras, para tentar dar base a um um governo, mesmo sem maioria no Knesset.
Com o bloco, Netanhyahu espera receber do presidente israelense, Reuven Rivlin, a incumbência de formar o novo governo, o que lhe daria vantagem nas negociações futuras.
Gantz pode, em tese, formar um bloco unindo o Azul e Branco com siglas de esquerda e com a Lista Unida, que representa a minoria árabe e que ficou em terceiro lugar.
Essa coalizão, porém, ficaria com 56 cadeiras, incapaz de formar o governo. Os líderes árabes também já indicaram que não pretendem entrar em um bloco e que preferem seguir independentes.
O consenso, no entanto é que, antes tido como “mágico político”, Netanyahu perdeu o tom pela primeira vez em dez anos.
Mesmo sabendo de sua capacidade de tirar coelhos da cartola quando se trata de sobrevivência política, a maior parte dos analistas acredita que o único real cenário seria a formação de um governo de união nacional entre Azul e Branco e Likud.
Nesse caso, Gantz serviria como primeiro-ministro por dois anos e Netanyahu o substituiria dois anos depois.
– Realisticamente, não há outro cenário, porque, por mais que você olhe para os números, ninguém tem maioria. Portanto, a única opção é um governo de união nacional – diz o professor e cientista político Emmanuel Navon, da Universidade de Tel-Aviv e do Centro Interdisciplinar de Herzliya.
E completa.
– Acho que, na verdade, é isso que a maioria dos israelenses quer: um governo centrista, estável e com pessoas em quem confiam, sem radicais e extremistas – afirma.
Já houve precedente, em Israel. Em 1984, o Likud e o Partido Trabalhista se viram em impasse similar e decidiram por um governo em conjunto, com cada legenda liderando o governo por dois anos. O líder trabalhista, Shimon Peres, assumiu o cargo de primeiro-ministro antes, substituído, em 1986, por Yitzhak Shamir, do Likud.
Mas, agora, parece que essa costura é mais complicada. Um dos motivos é a promessa de campanha de Benny Gantz de que não se entraria em coalizão com o Likud sob liderança de Netanyahu, que pode ser indiciado a qualquer momento por casos de corrupção.
Trocando em miúdos: ele aceitaria um governo com o Likud, mas sob liderança de outra pessoa. Segundo Emmanuel Navon, não se trata de um cenário impossível.
– Os mais veteranos do Likud estão cansados de Netanyahu. Só se mantinham fiéis enquanto ele vencia eleições. No momento em que ele não o fez -e este pleito foi uma derrota- a rebelião começa a borbulhar. Vai acontecer – aposta ele.
– Junta-se a isso o possível indiciamento e o fato de que as pessoas estão frustradas por ele ter sido cruel ao eliminar qualquer líder em potencial do partido nos últimos 20 anos. Possíveis sucessores apenas esperam a hora de puxar o tapete e se livrar dele – diz o cientista político.
Há dúvidas ainda se Netanyahu aceitaria trair a confiança de seus aliados tradicionais ao se unir a Benny Gantz e também, provavelmente, a Avigdor Lieberman, do partido Israel Nossa Casa.
Lieberman, maior defensor do govenro de união, jurou a seus eleitores seculares que não entraria em coalizões com partidos religiosos.
– É um problema para o Likud, porque, a longo prazo, o partido sabe que precisa de sua aliança com os ultraortodoxos para formar coalizões futuras e em próximas eleições – diz Navon.
O governo de união até poderia deixar o Israel Nossa Casa de lado, mas ficará com apenas 63 cadeiras, duas a mais que o necessário. Com os nove assentos que Lieberman conquistou, a coalizão superaria os 70 assentos, dando mais estabilidade ao governo.
Caso esse plano dê certo, a Lista Unida possivelmente se tornaria a maior força de oposição com suas 13 cadeiras –seria a primeira vez na história israelense que um líder árabe assumiria o comando da oposição. O resultado da sigla foi uma das surpresas da eleição.
Para Navon, Netanyahu errou ao realizar uma campanha eleitoral com incitações contra a minoria árabe-israelense (20% da população). O resultado foi a ida em massa de eleitores árabes às urnas, elegendo a Lista Unida como a terceira maior força do país.
– Nesse sentido, Netanyahu realmente deu um tiro no pé com sua campanha – apontou.
Mas Navon e outros comentaristas sabem que, quando se trata de Netanyahu e do Likud, é sempre possível esperar por surpresas.
*Folhapress
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