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A “volta por cima” de Ingra Liberato

Depois de anos longe da TV, a atriz se abre sobre suas emoções e seu crescimento pessoal

Virgínia Martin - 16/11/2017 12h56 | atualizado em 16/11/2017 13h12

O sucesso inicial foi assustador com muita exposição da imagem e eu não tinha maturidade para sustentar

Baiana, filha de poetisa e de cineasta, Ingra Liberato marcou presença no cenário das telenovelas com a personagem Ana Raio em Ana Raio e Zé Trovão, da extinta Rede Manchete, exibida nos anos 90. Já fez teatro e cinema, casou-se duas vezes e hoje, aos 50 anos, continua exibindo uma beleza que impressiona.

Ingra participou ainda de novelas da Globo como Tieta, Meu Bem, Meu Mal, Quatro Por Quatro, A Indomada e O Clone, além de 16 filmes e três premiações como melhor atriz em festivais de cinema. Mas o medo do sucesso e alguns temores pessoais acabaram afastando-a dos holofotes e a moça escolheu se recolher a fim de tratar de suas emoções. Recuperou-se, escreveu um livro, tornou-se mais forte e amadurecida. E é ela mesma quem fala ao Pleno.News sobre sua “volta por cima”.

Você lançou seu livro no ano passado. De lá para cá, o que tem mudado significativamente em suas ações pessoais e profissionais?
Em primeiro lugar, hoje tenho consciência de padrões de comportamento autossabotadores; e consigo desativá-los antes “deles” começarem a fazer estrago. E, sem duvida, começou uma nova etapa em minha carreira. Eu passei a vida toda escrevendo esporadicamente e tinha muita resistência em assumir a função de escritora, a autoria. Escrevia textos para revistas ou cenas de novelas em que eu participava e “deixava pra lá”. Uma espécie de arrogância disfarçada de humildade, como eu deduzo no livro O Medo do Sucesso. O problema disso é que você pode passar uma vida inteira sem desenvolver um dom. No caso do livro, depois que um editor leu as primeiras páginas e se interessou muito, comecei a escrever com confiança. O livro foi escrito em três meses e um roteiro de série foi selecionado pelo Prodav 03. Tudo aconteceu no mesmo período e eu não tive mais como fugir, graças a Deus. Hoje estou escrevendo alguns roteiros e meu segundo livro. Se estou ocupada com outras atividades como atriz ou com a família, aguardo ansiosa pelo tempo livre para poder colocar as novas ideias no computador. Elas borbulham dentro de mim e me sinto livre como se estivesse galopando em campo aberto. Nunca pensei que fosse dizer isso. Eu tinha tanto medo de me expor. Mas hoje me sinto tão realizada escrevendo quanto fazendo cena como atriz. A superexposição do livro O Medo do Sucesso me libertou. Coloquei todas as mentiras de uma vida inteira e com isso tirei as máscaras. Quero ser transparente. Não tenho nada para esconder.

Em que momentos, entre vida pessoal e carreira, o sucesso e suas demandas mais incomodaram você?
Os primeiros sucessos foram assustadores, porque eu não estava esperando. Foi muita exposição da imagem e eu não tinha maturidade para sustentar. Naquela época, também era casada com um diretor e comecei a sentir muitos ciúmes da atenção dele com as outras atrizes. Tinha medo de perdê-lo. Todo esse desperdício de energia suga nossas forças e deixamos de ser criativos. Nos tornamos escravos do ciúme e da possessividade. Na época, eu não tinha a menor consciência disso. Inventava mil desculpas, para mim mesma, por estar agindo daquela forma e me parecia correto. No livro, dou dicas para a pessoa identificar o medo que geralmente vem disfarçado de ótimos motivos para recuar. Foi um estudo fino.

Você chegou a fazer algum tratamento psicoterapêutico para detectar a razão de sua resistência ao sucesso, que gerou uma autoexclusão do meio artístico?
Nunca fiz terapia de modo convencional, mas tive e tenho amigas terapeutas incríveis que me ajudaram muito em momentos de grandes mudanças. Gosto de me autoanalisar; e, aos 50 anos, acho que consigo me enxergar um pouco. Mas quem deu o diagnóstico foi a fundadora da ONG Paz Sem Fronteiras, Ana Vitória Vieira Monteiro. Uma estudiosa da alma humana que num dia de estudos, me disse numa conversa particular: “Você tem medo do sucesso. Deveria escrever sobre isso”. No início, me choquei com o que ouvi. Explico isso na introdução do livro. Passei vários dias revisitando minha vida e meus sentimentos mais profundos até constatar que ela estava certa. Foi muito difícil começar e em alguns momentos do relato, achei que não aguentaria tanta exposição. Foi um parto.

Acha que o ciclo repetitivo de ganhos e perdas e desperdícios era resultado de um boicote? Ou seja, achar que não era merecedora de muitos ganhos, o sucesso?
Exatamente isso! Achava que não podia ser verdade. Era casada com o homem que amava e tinha sucesso profissional. Achava que seria abandonada ou que fracassaria profissionalmente. Carreguei essa sensação nos dois casamentos. Infelizmente aceitamos mais a dor e o sofrimento do que a alegria e a autorrealização. Precisamos aprender que o normal para todos é estar bem em todos os sentidos. Que a vida tende a dar certo e se não está dando, é porque de alguma forma estamos atrapalhando. Somos nós que criamos o inferno. Ele não existe. É uma ilusão da mente. Já a união e o amor são verdadeiros. Mas precisamos ir fundo para descobrir essa essência debaixo de muitas máscaras de autoproteção. Os jogos do ego são terríveis e nós não sabemos nada sobre isso. Deixamos ele nos comandar. Entendo hoje que o autoconhecimento é o caminho da liberdade verdadeira. Saber acender a luz para fazer desaparecer nossos monstros. Não existe nada lá fora. Está tudo dentro da gente: o céu ou o inferno.

Em quê os dois divórcios influenciaram para sua reconfiguração de visão de vida e reposicionamento de carreira?
As relações afetivas são a grande escola. Graças a Deus sempre admirei e quis o bem dos meus ex, mesmo separada. Tenho uma amizade verdadeira com os dois. Mas o grande aprendizado veio hoje. Olhando para trás, percebo que tinha sempre uma tendência a me anular. A achar que o mundo tinha parado para eu viver o amor. Não, o mundo não para e se abandonarmos nosso propósito profissional, um dia a conta chega: infelicidade e desilusão. Hoje, vejo meu trabalho como algo tão sagrado quanto as relações. Aliás, tanto meu trabalho como minhas relações são alimentadas com amor e entrega. Hoje confio que tudo vai dar certo e não determino o que é “dar certo”. Só sei que não vou perder a oportunidade de amar.

Você chega a ver Deus nisso tudo?
Sem dúvida. Deus é a verdade. O amor é a verdade. É o céu sempre limpo acima das nuvens. As circunstâncias são nuvens passageiras, mas Deus não. O amor é a nossa essência. Acredito que sou a manifestação de Deus e tudo o que eu faço é expressão Dele. Sinto claramente a guia de uma inteligência acima da nossa visão limitada.

As rápidas e crescentes oportunidades de trabalhos relevantes assustaram você. Hoje, como acha que deveria ter reagido diante dessas possibilidades?
Tudo acontece como deve ser. Com minha experiência aprendi muito e agora posso falar disso. É uma grande oportunidade. Mas respondendo à sua pergunta, hoje me preparo para receber as bênçãos da vida de braços abertos e com gratidão. Com amor não há espaço para o medo. São incompatíveis. Estou aprendendo a não querer controlar a vida. No máximo busco o controle da minha mente através do autoconhecimento para transformar sentimentos autodestrutivos. Mas fora de mim, não posso controlar nada e fiz as pazes com essa verdade.

O que acha que mais perdeu ou ganhou com suas estratégias de “fuga”?
Perdi oportunidades de expansão, mas ganhei muita experiência. Criei muitas amarras para mim mesma e estar desatando cada nó, está me trazendo alguma sabedoria para aproveitar, de verdade, a vida.

O que aconselha para quem está iniciando a carreira artística e pode passar pela mesma situação?
Não acredite muito no aplauso e nem nas vaias. Receba, reflita, mas se firme na entrega e no amor pelo que faz. A força reside aí dentro. Parece que está fora, mas é uma ilusão. Quando eu tinha tudo, estava muito infeliz e hoje me sinto tranquila, no caminho certo; independentemente do que está acontecendo à minha volta, pois a verdade está dentro da gente. Porém, sei que não adianta muito eu falar isso. É como tentar descrever o sabor de uma fruta. Você terá que experimentar para conhecer.

Enfim, de que forma é possível transformar crenças autodestrutivas em gratidão e paz interior?
Lembrando que o que recebemos é um presente do universo. Que tudo deve ser recebido como uma oportunidade de crescimento. Até o que parece ser ruim. Quando eu sofri por acreditar nas ilusões, destruí tudo o que tinha recebido da vida. Quando me vi sem mais nada, pude enxergar toda a riqueza e alegria dentro de mim. Parece papo de alguma religião, mas é pura experiência de vida. Veio a força da entrega e eu comecei a encarar o que me causava medo. Quer dizer, fora de mim, o mundo ruía e, dentro de mim, renascia. Se a gente agradece sempre, o universo corresponde a essa vibração luminosa. Pode crer!

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