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Como vou viver sem você?

E quando a sua metade é arrancada assim, sem aviso, tudo tão brusco? Como aprender a viver sem você?

Yvelise de Oliveira - 12/06/2018 09h42

Recentemente, uma querida amiga, amada como uma irmã, passou por um desses caminhos que a estrada da vida nos reserva mas que pensamos sempre: “Não vai acontecer comigo.” Perdeu o seu companheiro, seu marido, seu amor… Formavam um casal adorável, viviam para serem felizes, e onde eles estivessem, o amor estava no ar.

Sempre nos casamos com muitos sonhos, propostas no coração de se ser feliz e fazer feliz, construir um porto seguro, ter um marido e ter nossos próprios filhos.

Os anos vão passando… E no casamento a gente é feliz por vários momentos, infeliz algumas vezes. Cuida dos filhos, da casa, do marido; trabalha fora, tem pouco tempo para si mesma. O tempo
passa sorrateiramente… levando sonhos que não se realizaram, outros que nem sonhávamos em realizar; acrescenta beleza à vida, momentos inesperados de amor que ficam para sempre gravados no coração do casal.

Embora o tempo vá levando a beleza física, em um casamento os olhos veem muito além do corpo: veem a alma do companheiro. São anos de cumplicidade, de admiração mútua, de sorrisos compartilhados, de mãos que se conhecem, se completam, vivem na mesma sintonia, a ponto de não saberem onde termina um e começa o outro. São uma unidade, para o que der e vier.

Sei que isso não é muito comum hoje em dia. Existem casais que se suportam, vivem de aparências, de interesses comuns, são mais sócios do que marido e mulher. São casados por conveniência.

Mas eu, hoje, quero falar dos casais que são carne da carne, cujas vidas são interligadas e tão unidas que, embora não saibam, um não poderia viver jamais sem o outro. Olham na mesma direção,
sentem um enorme prazer em estarem juntos, experimentaram todas as formas de amar, vivenciaram juntos tudo.

E tudo o que importa é continuarem juntos, os dois sozinhos – ou acompanhados dos filhos, dos netos – sentirem que ainda podem fazer brilhar os olhos do outro e ambos respiram o mesmo ar.

“Como vou viver sem você?”.

Para que eu me fizesse essa pergunta, e refletisse, profundamente, sobre todos esses anos de casamento em que vivenciamos tanta coisa juntos, tive que viver o pesadelo da minha amiga, tive que sentir sua dor, que de tão grande não achou espaço para sair toda, deixando-a atordoada, sem referencial e sem chão. A metade dela arrancada assim, sem aviso, tudo tão brusco que posso sentir que, por um tempo indeterminado, ela irá ficar ali, parada, perdida, no labirinto da sua dor, sangrando, esperando que o tempo faça o seu trabalho…

A pergunta que ela me fez ficou ecoando dentro de mim…

“Como vou viver sem ele?”.

A gente perde o pai, a mãe, sofre, chora e se ampara mais ainda no companheiro, na companheira, meu marido, minha esposa. Os filhos crescem, casam-se e vão viver as suas vidas. A família cresce; são netos, sobrinhos, genros, noras, mas todos têm as suas vidas. No final, resta mesmo o princípio de tudo: o casal, ela e ele, ele e ela.

Um conhecimento lúcido e claro veio sobre mim vendo a dor da minha amada amiga.

“Como vou viver sem você?”.

Porque viver juntos tantos anos faz a gente achar normal estar assim tão unidos. Nem me dou conta de que, às vezes, sou implicante, que me irrito com meu marido, reclamo por besteiras, fico dias aborrecida com coisas tão sem importância… Como posso desperdiçar um dia que seja com brigas e discussões?!

Dou-me conta, também, de que faz um tempão que não digo “Eu te amo”, que não rio das suas tolices, nem sou paciente para com o que ele precisa. Passo os dias cobrando coisas, criticando sem
necessidade.

Posso ouvir você, minha amiga, dizendo: “Por quê? Por quê? Como você pôde me deixar assim, sozinha, em uma parte tão difícil da nossa caminhada, quando já não sou tão jovem para recomeçar e nem tão velha para desistir?”.

“Como vou viver sem você?. Nós fomos tão felizes, tão felizes…”

Se não fosse você, minha amiga, se não fosse a minha intimidade com sua perda, eu não teria acordado a tempo de repensar a minha vida.

Só fico muito triste de ter aprendido a valorizar mais o que tenho dessa forma tão dolorosa, mas sei que vale algum consolo haver-me feito refletir e mudar. Nesse momento, estivemos muito próximas. Foi bom ver você sentindo o meu amor fluindo forte e meu coração batendo alto e dizendo: “Eu posso entender você, eu estou aqui, e, enquanto uma de nós viver, acharemos uma forma de trocar a dor por ensinamento, a solidão por companhia e de transformar a saudade em boas lembranças. Afinal, você vai ter que encontrar a resposta de: “Como vou viver sem você?”.

Yvelise de Oliveira é Presidente do Grupo MK de Comunicação; ela costuma escrever crônicas sobre as suas experiências e percepções a cerca da vida. Há alguns anos lançou o livro Janelas da Memória, um compilado de seu material. Atualmente está em processo de finalização de uma nova obra, Suspiros da Alma.
* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.
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