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As políticas públicas de proteção animal

Os maus tratos aos animais, como o abandono, são punidos como crimes de menor potencial

Vinícius Cordeiro - 08/11/2018 16h01

Com o recente encerramento do período eleitoral no Brasil, vimos algo inédito: alguns candidatos à presidência da república incluíram em seus programas de governo capítulos dedicados ao tema da proteção animal – pelo menos, Ciro Gomes, Marina Silva, Alckmin e Bolsonaro. Eles trataram do tema na campanha, abordando a necessidade de se criar um órgão para cuidar desta política pública em nível federal, algo até então inexistente.

Também se abordou a necessidade de se endurecer a punição legal aos maus tratos aos animais, hoje classificada como crime de menor potencial ofensivo, o que dificulta seu combate, bem como articular programas de controle populacional de animais domésticos com os municípios. Toda essa atenção ao tema culminou, após o anúncio da vitória de eleitoral de Jair Bolsonaro, com a divulgação da criação de uma Secretaria Nacional de Proteção Animal.

Assim como ocorreu com as políticas públicas de idosos, deficientes, mulheres, o estabelecimento de uma organização nacional impulsionará de forma mais rápida e considerável, sua replicação em cidades de todo o país.

Na verdade, o avanço legislativo e das políticas públicas neste setor tem sido lento, e começou nas grandes cidades brasileiras. O Rio de Janeiro, em 2000, criou uma Secretaria Especial para o tema, a SEPDA, exemplo imitado por capitais como Porto Alegre, diversas cidades paulistas, e do Sul do país, principalmente. Diversas cidades criaram secretarias, coordenadorias, ou simplesmente, órgãos para tratar do tema, em boa parte vinculada à secretaria de meio ambiente local. Mas nem 20% dos municípios tem órgãos que cuidam do tema, infelizmente.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Junto à criação de órgãos locais de proteção animal, muitas cidades possuem uma legislação que trata de adoção, abrigos, maus tratos, e algumas avançaram mais, ao criar um fundo próprio e conselhos municipais para definir e organizar as políticas públicas. Há nestas cidades, uma luta em entender o papel e o tamanho das organizações não-governamentais, como as ONGs e grupos organizados de proteção, a OAB e as entidades veterinárias. Outro aspecto interessante é que os legislativos municipais e até estaduais têm criado comissões parlamentares temáticas que tratam com exclusividade, como na ALERJ, mas que infelizmente são comissões de caráter transitório, não-previstas regimentalmente, com atuação em geral episódica e não tão relevante.

As políticas públicas de proteção têm sido confundidas, infelizmente, com programas de controle populacional de animais domésticos. Enquanto que o combate ao tráfico, maus tratos, a questão dos animais silvestres e marinhos e a adoção têm sido alvo de ações ativistas, da sociedade civil. Os governos têm sido tímidos, até porque, embora o tema tenha crescido na atenção popular, e consequentemente de políticos, a crise financeira e fiscal que o país atravessa não permite que os orçamentos destinados aos órgãos de proteção sejam suficientes para as demandas.

Curiosamente, quando há investimento em controle populacional, com programas públicos, que devem ser priorizados para a camada mais pobre da população, há reação de veterinários, que exploram esse serviço. Assim como de ONGs de proteção, e protetores independentes que fazem da castração atividade de renda complementar.

O fato é que há toda uma agenda de políticas públicas a se avançar. Porquanto, há necessidade de entendimento melhor sobre o tema. Recentemente, o governador do Rio de Janeiro vetou projeto de lei que impunha diversas obrigações aos que se dedicassem à adoção, o que dificultaria completamente a atividade, que certamente ajuda o Estado. Ou ainda recentemente discutimos revisar a legislação estadual de abrigos, já que o legislador impõe aos mesmos, que na verdade, fazem o papel estatal, como a SUIPA carioca, que cumpram diversas obrigações que quase os inviabiliza.

Os maus tratos aos animais, como o abandono, são punidos como crimes de menor potencial, na Lei Federal n. 9605. As cidades também podem prever sanções administrativas, como multas, que quase sempre ainda têm valores pífios ou insuficientes para se penalizar adequadamente os infratores.

De igual forma, enquanto as políticas públicas avançam ao ponto de se estabelecer, finalmente, um órgão nacional, as prefeituras do Rio de Janeiro e Porto Alegre, por exemplo, extinguiram a Secretaria temática, e cortaram pesadamente os pequenos orçamentos que estas dispunham. O STF considerou inconstitucional a lei municipal de Santos que tentava impedir o embarque de cargas vivas, e há grande resistência de legisladores do Nordeste quanto à realização de vaquejadas. Por fim, a Prefeitura de Petrópolis, que recentemente viu sua população decidir pelo banimento da tração animal, que subsiste ainda em cidades como Paraty, não implementa a decisão alegando falta de condições orçamentárias.

O fato é que no campo das políticas públicas da proteção animal, há muito a ser feito, estudado, divulgado e compreendido, mas estas têm uma expansão visível na Europa, nas grandes cidades em todo o mundo. Não somente em países ricos e industrializados, mas pode-se dizer que o avanço destas simboliza um grau de amadurecimento de uma sociedade.

Vinicius Cordeiro é advogado, ex-Secretário de Proteção Animal do Rio de Janeiro.
Bruna Franco é ativista, dirigente da ONG ADDAMA e produtora executiva da ONG Celebridade Pet.
* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.
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