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Coluna Pr. Lucas: Aitofel

Aitofel foi um personagem do antigo testamento. Embora distante, temos muito a aprender com sua história

Pr. Lucas - 15/01/2018 09h15

Você deve estar se perguntando sobre este título estranho: Aitofel. Então, antes de discorrer minhas ideias, quero explicar sobre o que é Aitofel.

O significado desse nome, em hebraico, é: “irmão insano” ou “insensatez”.

Aitofel foi um personagem do antigo testamento, um conselheiro de Davi, avô de Bate-Seba (2 Sm 11:3; 23:34 ), que se uniu a Absalão na revolta contra Davi, e cometeu suicídio quando Absalão não fez caso do seu conselho.

Vendo, pois, Aitofel que se não tinha seguido o seu conselho, albardou o jumento e levantou-se, e foi para sua casa e para a sua cidade, e pôs em ordem a sua casa, e se enforcou: e morreu, e foi sepultado na sepultura de seu pai” (II Sm 17:23). Este texto é chocante? Sim. Muito. E ele faz parte da Bíblia.

No final de 2017 tivemos três registros chocantes, a respeito de três pastores; entre eles uma pastora; que atentaram contra a própria vida usando o método do enforcamento.

Sou pastor, tenho 33 anos de idade e, talvez, eu possa tentar entender os motivos que levariam um pastor a tirar sua própria vida.

De modo geral, as pessoas têm expectativas irreais a respeito de um pastor. Via de regra, ele não pode falhar, não pode rir de uma piada, não pode adquirir bens, senão logo pensam que está extorquindo da igreja. Também não pode se divertir, não pode faltar a uma reunião de oração, nem ficar doente. E, jamais, em hipótese alguma, pode sofrer de depressão ou estresse. De modo nenhum pode tomar remédio, piorou se for medicação com tarja preta; não pode se consultar com o psiquiatra. Ainda, não pode gostar de um programa de TV, senão logo ouvirá uma piada sobre não estar orando ou lendo a Bíblia.

O pastor não pode ter amigos, ele sempre é procurado para ouvir os problemas alheios e ajudar as pessoas, mas nunca se sentar com alguém para falar de suas fraquezas. Ele nunca desabafa, nunca pode se expressar, não pode extravasar, não pode se entristecer e muito menos se magoar.

O pastor não pode dizer algumas palavras como: “não posso hoje”; “você está errado”; “não concordo com você”; “não apoio você, nisso”; “não tenho tempo”… e, entre tantas outras palavras, a mais insuportável é: “hoje não! Hoje é minha folga”, pois o pastor não pode ter folga.

Também, o pastor não pode ter filhos imperfeitos, nem esposa que não seja proativa. Um pastor não pode ter um melhor amigo, senão logo dirão que ele faz panelas e acepção de pessoas. Um pastor não pode ter modismos, nem ser moderno, senão ele será mundano. Um pastor não pode apoiar o grupo de jovens, senão os irmãos mais velhos vão infernizar a vida dele, vão denunciá-lo à Convenção por trazer o mundo para a igreja. Mas se ele apoiar somente os mais velhos, começará a ver as famílias se desintegrando ao perder os filhos dos irmãos.

Um pastor é culpado por cada membro irresponsável. Se alguém foi ignorante, a culpa é do pastor; se alguém não cumprimentar outra pessoa a culpa também é do pastor; se alguém compra e não paga é como se o pastor tivesse feito a dívida.

Um pastor não pode descansar, não pode dormir até tarde, não pode esquecer nome e nem data de aniversário de ninguém; não pode deixar de comparecer a uma festa, nem a um chá de bebê ou a um churrasco dos irmãos.

E, eu poderia continuar essa lista terrível, até completarmos um mês de artigos, só sobre os “erros” que um pastor não pode cometer.

É lógico que não estou aqui apoiando o ato aitofel (insensato) dos meus colegas pastores, que se suicidaram. Mas gostaria de aproveitar este artigo para pedir as pessoas que amem seus pastores, que os olhem com respeito mas também com compaixão e carinho quando necessário.

Eu não posso falar por todos, não fui autorizado a representar nenhum Conselho de pastores, mas posso falar por mim: Não espere perfeição de mim, não espere que eu nunca fale uma bobagem, ou que não me entristeça, não me magoe, não me irrite… Eu sou humano! Não digo isso para trazer conformidade com os meus defeitos, mas afirmo essas coisas para ser compreendido como ser humano que sou, caso eu não seja exatamente o que você pensou que eu fosse!

Por isso, não espere que eu não deslize na Teologia. Eu não sei tudo! Muitas coisas que acredito ser verdades hoje, podem ser abaladas amanhã e eu descobrir que minha interpretação de texto estava completamente errada. Também não pense que minha vida é só igreja. Eu amo a igreja, mas tenho família, preciso passear, jantar fora com minha esposa e desligar o celular algumas vezes. Também preciso tirar férias, preciso me divertir, brincar com meus filhos e ter alguns momento de privacidade.
Eu preciso dizer NÃO, às vezes, e isso não me torna alguém ruim.

Claro, que não estou pedindo para ser colocado em um Lugar onde eu não deva ser confrontado se errar; só estou pedindo que, mesmo que mereça ser confrontado, que você o faça com amor! Me amem a ponto de não me deixar no erro, mas nunca julgue nem a mim nem a ninguém, sem misericórdia. Pois, só sabe o valor da misericórdia, quem um dia precisou dela!

Eu quero aqui deixar meus sentimentos à família dos queridos pastores que por um momento foram tomados pela insensatez de Aitofel. De forma alguma quero aumentar a dor dos que ficaram, mas quero deixar aqui meu alerta a todos e, em especial, aos meus amigos Pastores.

Aqui vai uma posição radical, e quero deixar bem claro que essa é uma posição minha, ok?

Pastores,
Ser pastor é incrível; é um privilégio; mas você não precisa morrer pela igreja, pois alguém já morreu por ela! Você é uma pessoa. Então, priorize sua família, ame a sua vida. E, se for preciso, se houver uma situação extrema, deixe de ser um pastor, mas não abra mão de ser um salvo, uma boa pessoa, um bom filho, um bom marido e um bom pai.

Que o Senhor nos ajude a ter saúde emocional e não cometer a loucura de Aitofel.

E, minhas sinceras condolências às famílias dos pastores: Júlio Cesar, Ricardo Moisés e Lucimari Alves Barros.

Pastor Lucas nasceu em Santa Vitória, em Minas Gerais. Sua carreira de compositor começou em 2011. Há quatro anos como cantor, lançou três CDs. Congrega na Comunidade Evangélica Vida no Altar, em São Paulo. É casado com Thaisa Rahmé e pai de Gabriel e Samuel.
* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.
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