Juliana Leite - 27/10/2025 09h42

A esquerda brasileira não mora mais nas ruas — mora nas coberturas. Ela tem assessoria, curadoria e passagem carimbada para Lisboa. Os que um dia falaram em povo agora colecionam arte contemporânea e palestras sobre empatia. O discurso revolucionário virou um acessório de luxo, usado para disfarçar a distância entre quem fala de fome e quem nunca deixou de comer bem.

A nova vanguarda mora em Ipanema, tem casa em Salvador e consciência social terceirizada. São os donos do discurso e das leis não escritas da “máfia do dendê” — aquela confraria de artistas, produtores e intelectuais que decidiram, há muito, que pensar diferente é crime de lesa-estilo.

Caetano é o oráculo dessa tribo dourada: fala em liberdade com o mesmo tédio com que um banqueiro fala de lucro. Ele e seus pares vivem de uma rebeldia vintage, reciclada em shows patrocinados e lives de moralidade seletiva.

São atores premiados, banqueiros com culpa estética e herdeiros que encontraram na “causa” uma forma de lavar a consciência. Pregam igualdade enquanto negociam incentivos fiscais, posam de humanistas em jantares com champagne e aplaudem a própria virtude como se fosse coragem. O socialismo deles não cabe em fábrica — cabe em camarote.

O povo, esse mesmo que servia de bandeira, virou figurante. A esquerda, agora, é a elite que posa de mártir com vinho francês na mão. Falam de empatia em inglês e de igualdade em jantares privados. São a prova viva de que, no Brasil, até o privilégio aprendeu a se disfarçar de consciência social — e que toda revolução, quando patrocinada, termina em tapete vermelho.

Juliana Moreira Leite é jornalista especialista em cultura, escritora e curiosa. Nesse espaço vai falar sobre assuntos da atualidades sob a sua visão.

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