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O gosto amargo da impunidade

A crise do metanol é o epitáfio do bom senso, o retrato de um país que perdeu a capacidade de distinguir o crime do cotidiano

Juliana Leite - 06/10/2025 09h23

Drinques (Imagem ilustrativa) Foto: Pixabay

O Brasil tornou-se um romance de má digestão, desses que o autor abandona no meio porque a realidade ultrapassa qualquer ficção. O país, esse personagem desbocado e insolente, não tem mais pudor: tudo é cambalacho, tudo é truque barato de feira. Estamos nas mãos de bandidos que sorriem nas entrevistas, discursam sobre democracia e, entre um café e outro, assinam o próximo golpe.

Há uma sensação viscosa no ar — um cansaço cívico, uma náusea moral — como se viver aqui fosse um exercício de resistência à farsa cotidiana.

Você sai para tomar um drinque, rir com amigos, e descobre que a bebida pode te deixar cego ou morto.

A crise do metanol é mais que um escândalo sanitário — é o epitáfio do bom senso, o retrato de um país que perdeu a capacidade de distinguir o crime do cotidiano. Cada gole é uma roleta-russa servida em copo de vidro. O bar, que antes era refúgio da lucidez ou do esquecimento, agora é território de risco, contaminado pela mesma irresponsabilidade que corrói o resto.

Tudo aqui é metáfora da mesma doença: o descaso. As instituições, os hospitais, os bares, o governo — todos operam sob a lógica do improviso e da impunidade. O metanol é só o novo capítulo da mesma história: a de um país onde o erro é sistema e a punição, exceção.

Vivemos entre assassinos elegantes e idiotas impunes, e o resto de nós tenta manter a vista, o humor e a sanidade — como se ainda houvesse esperança de que a lucidez não seja, também ela, adulterada.

Juliana Moreira Leite é jornalista especialista em cultura, escritora e curiosa. Nesse espaço vai falar sobre assuntos da atualidades sob a sua visão.

* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.

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