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Bolsonaro exclui sociedade civil do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas

É do debate entre governo e sociedade civil que nascem as melhores políticas

Helder Caldeira - 22/07/2019 16h15

Presidente Bolsonaro Foto: Alan Santos/PR

Na manhã desta segunda-feira (22), o presidente Jair Bolsonaro cometeu um equívoco brutal ao eliminar a participação da sociedade civil no Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (CONAD). Conselhos dessa natureza, nas três esferas (União, Estados e Municípios) não são paritários por acaso. É do debate entre governo e sociedade civil que nascem as melhores políticas, as mais eficazes e com o devido respaldo científico, acadêmico e mesmo de vida cotidiana. É pilastra de um Estado Democrático.

Vale destacar que nenhum dos membros desses conselhos recebe salário. São funções, apesar de importantes, meramente honoríficas. Eliminar a sociedade civil, para além de enfraquecer o debate, encolhe o próprio Bolsonaro como Chefe de Estado e Sérgio Moro como titular do Ministério da Justiça e Segurança Pública e atual presidente do citado conselho, que tem vivido dias sob feroz ataque quanto sua conduta enquanto juiz federal em Curitiba.

Golpes abaixo da linha da cintura não engrandecem ninguém. Ao contrário, iguala presidente e ministro aos seus algozes quanto às estratégias nada republicanas.

Por outro lado, a “grande mídia” derrapa na casca de banana quanto questiona a legitimidade do presidente ao citar, em forma de contestação, recente decisão do Supremo Tribunal Federal, que por unanimidade de seus ministros, estabeleceu que a “Presidência da República não pode extinguir conselhos da Administração Federal que tenham amparo em Lei”.

Extinguir conselhos não é a mesma coisa que reformular suas composições. O escudo constitucional possui clareza meridiana quando estabelece ao Art. 2º (Princípio da Separação dos Poderes) e Art. 84, VI, da Constituição de 1988,que compete privativamente ao Chefe do Poder Executivo “dispor, mediante Decreto, sobre a organização e funcionamento da Administração Federal, quando não implicar aumento de despesa ou extinção de órgãos públicos”.

O Decreto assinado pelo presidente Bolsonaro não extingue o CONAD. Apenas promove a reformulação de seus membros.

Aliás, se a imprensa tivesse um pouco mais de cuidado — e assim deixo claro como penso: todo jornalista da área deveria cursar também Direito —, teria observado duas jurisprudências do STF sobre o assunto. Quais sejam:

1) “O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. Essa prática legislativa, quando efetivada, subverte a função primária da lei, transgride o princípio da divisão funcional do poder, representa comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e importa em atuação ‘ultra vires’; do Poder Legislativo, que não pode, em sua atuação político-jurídica, exorbitar dos limites que definem o exercício de suas prerrogativas institucionais.” (STF, Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.364-1/AL, Relator: Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJ de 14/12/2001);

e 2) “É indispensável a iniciativa do Chefe do Poder Executivo (mediante Projeto de Lei ou mesmo, após a EC 32/2001, por meio de Decreto) na elaboração de normas que de alguma forma remodelem as atribuições de órgão pertencente à estrutura administrativa de determinada unidade da Federação.” (STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.254/ES, Relatora: Min. Ellen Gracie, Tribunal Pleno, DJ de 02/12/2005).

Então, apesar de particularmente considerar a medida desnecessária, duvidosa e péssima para a imagem do presidente da República e do ministro Moro, não há qualquer vestígio de ilegitimidade no Decreto.

A imprensa precisa ter mais responsabilidade e conhecimento para exercer com dignidade o ofício da informação.

Helder Caldeira é escritor, colunista político e palestrante. Há duas décadas atua e escreve sobre a Política brasileira. É autor dos livros ‘Águas Turvas’, ‘Bravatas, gravatas e mamatas’, ‘Pareidolia política’, entre outros. Contato: eventos@heldercaldeira.com.br
* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.
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