O judiciário independente que Moraes deseja é um câncer
A democracia não vive da independência dos seus poderes, mas da interdependência entre eles
André Marsiglia - 26/08/2025 13h35

O ministro Alexandre de Moraes repetiu, em evento dos últimos dias, que o Brasil possui um “Judiciário independente”. Repetiu tantas vezes a expressão que parecia querer convencer a todos pela insistência, pela exaustão; não, pela verdade do que expunha.
Moraes parece querer a independência do STF, mas não para que seja exercida ao lado dos demais poderes. Quer um STF independente dos próprios poderes da República: independente do Executivo, do Legislativo, do povo e, por fim, independente até do Brasil. Quer uma soberania sem controle, um poder absoluto disfarçado de democracia.
O sistema constitucional brasileiro é estruturado pela lógica dos freios e contrapesos, que obriga cada poder a dialogar e a se conter mutuamente. O Judiciário existe para agir em equilíbrio com outros poderes. Mas não é isso que acredito desejar Moraes. Ele parece querer um STF independente para reinar sozinho sobre os demais.
Nesse sentido, com tal visão, a independência não é uma virtude. Longe disso. O câncer também é uma célula independente. Uma célula que, ao se descolar da harmonia das demais células do corpo, passa a crescer sem limites, devora o organismo do qual faz parte e o mata.
O tumor não obedece às regras do conjunto, segue seu impulso de forma independente e soberana, como parece pretender o STF. Um Judiciário independente de todos os limites externos: da lei, da sociedade, da política, e até dos seus próprios pares, é nocivo, passa a ser fator de desarmonia.
A democracia não vive da independência dos seus poderes, mas da interdependência entre eles. É a harmonia entre as instituições que garante estabilidade. É o diálogo, mesmo conflituoso, que impede abusos. Quando um poder se declara “independente de tudo”, e submete todos a seus comandos, estamos diante de uma ditadura.
O Judiciário brasileiro, sobretudo o STF, escolheu esse caminho perigoso. O tribunal deixou de ser parte de um arranjo constitucional e passou a atuar como poder soberano, como uma célula independente, como um tumor institucional. Um poder isolado, sem harmonia com os demais, que corrói a democracia sob o pretexto de a defender.
O STF, a seguir esses passos, acabará sozinho, independente de tudo, independente do direito, independente do Estado democrático.
* Texto originalmente publicado no Poder360.
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André Marsiglia é advogado, professor de Direito Constitucional e especialista em liberdade de expressão. |
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