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Gabriela Doria - 24/10/2019 17h49 | atualizado em 24/10/2019 19h58

Guta Alencar e os filhos Foto: Reprodução

Uma mulher passou pelo pior pesadelo dos pais ao perder não um, mas dois filhos para o suicídio. Guta Alencar, uma gerente administrativa da cidade de Juazeiro do Norte, no Ceará, se despediu dos dois filhos adolescentes num intervalo de três anos.

Em entrevista ao Universa, do portal Uol, Guta relembra o pai abusivo, que cometeu suicídio no ano de 2004, no Dia dos Pais.

– Meu pai era um homem violento e abusivo, então tive que sair de casa bem cedo para fugir dessa violência.Em 2001, tirei minha mãe e meus irmãos de casa, e fomos todos morar juntos. Meu pai cometeu suicídio em 2004, no Dia dos Pais. Meus filhos não conviveram com o avô, mas sabiam da relação abusiva que tinha comigo e com meus irmãos. Como não recebi carinho em casa, dei aos meus filhos tudo que não pude ter. Éramos muito unidos, e eu me considero uma mãe cuidadosa. Os amigos dos meus filhos até brincavam, dizendo que queriam que eu fosse a mãe deles – conta.

Guta diz ainda como foi a criação dos filhos do primeiro casamento. Hoje, ela é mãe da menina Eva, de 5 anos.

– Conheci o pai dos meus filhos com 21 anos. Era muito inexperiente, e terminamos quando estava grávida do meu segundo filho, o Davi. Ele registrou os meninos, mas os criei com a ajuda da minha mãe e meus irmãos – revela.

Cristã, a gerente criou os filhos dentro da igreja, onde eles eram dedicados às atividades.

– Somos uma família cristã e meu mais velho, Felipe, era muito dedicado à igreja, tocava violino, dava aula de música, participava de todas as atividades. Aos 15 anos, ele se apaixonou por uma moça da mesma igreja, cinco anos mais velha. Por causa da idade, a mãe dela não a deixou namorar. Mas os dois viviam juntos e eu ajudei no que pude, inclusive o levava para se encontrar com ela. Essa situação deixava meu filho muito triste – disse Guta.

Os irmãos Davi e Felipe eram unidos Foto: Reprodução

As restrições ao relacionamento causavam brigas entre os namorados.

– Felipe não tinha depressão. Era um menino cheio de vida, queria ser obstetra, estava no segundo ano do ensino médio, vivia estudando. No dia 14 de julho de 2016, saí para trabalhar, e por volta das 13h ele me disse, por mensagem, que queria comprar um tênis naquela semana, então combinamos de ir no sábado. Logo após a mensagem, o meu outro filho, Davi, me ligou avisando que o Felipe tinha saído e deixado o celular e a chave em casa. Achamos estranho e imaginei que ele tivesse ido à casa da namorada. Liguei então para ela e pedi que me ligasse assim que ele chegasse – relembra a mãe.

A mulher descreve com detalhes o momento em que sentiu que algo estava errado.

– Eram 16h quando meu coração apertou. Foi nesse exato momento que meu filho se matou, aos 16 anos: ele não tinha saído de casa. Ficou escondido, esperando o irmão sair para cometer o suicídio. Meu marido o encontrou. Depois, vimos que ele e a namorada tinham discutido por mensagem de aplicativo, e ela sugeriu que queria terminar o relacionamento, mas pessoalmente. A última mensagem dele foi: “Vou sofrer, mas…”. Ele não deixou carta – contou.

Após o trauma, a família não conseguiu mais viver na mesma casa. Guta se mudou para a casa da sogra, avó de Eva.

– Não retornamos mais. Eu e Davi entramos em depressão e passamos a ter acompanhamento psiquiátrico. Depois fui entender: além de perder o irmão, ele sentia culpa. A namorada do Felipe tinha pedido para ele conferir se o irmão não estava mesmo em casa, mas ele não foi olhar. Confiou que o Felipe realmente tinha saído – afirmou.

Já neste ano, Guta conta que Davi se mudou para Sobral, também no Ceará, com o objetivo de estudar para o vestibular. O rapaz queria fazer psicologia.

– Para mim, essa mudança faria bem. E fez. Ele começou a namorar, mas em maio pediu para se consultar com um psiquiatra novamente. Recuperei mensagens dele para a namorada falando que não estava bem, mas não queria preocupar ninguém. Ele ligou para o CVV (Centro de Valorização da Vida), mas tinha 17 pessoas na fila de espera e desistiu – lembrou.

No dia 28 de junho deste ano, praticamente três anos após o suicídio do irmão, Davi seguiu o mesmo destino.

– Davi foi encontrado no quarto da casa onde morava, da mesma maneira que Felipe, na madrugada de 28 de junho deste ano. Tinha 18 anos. É inevitável não se sentir culpada. Perder um filho é trágico demais, ainda mais por suicídio. Quando é por doença, você culpa essa doença. Quando é acidente ou assalto, a mesma coisa: você culpa o outro. Você tem a necessidade de culpar alguém. Mas, quando é suicídio, você pensa: ‘O que foi que eu fiz?’ – questiona a mãe.

Hoje, poucos meses após a perda do segundo filho, Guta ainda busca forças para seguir a vida e cita Deus como “fundamental” nesta luta.

– Nunca culpei Deus nem a namorada do meu filho. Não adianta remoer. A principal luta de uma mãe que perde um filho é abstrair o sentimento de culpa. Não é fácil. Você tem recaídas. Já pensei em tirar a minha vida e tem dias em que não saio da cama. É normal. Sigo o lema “só por hoje”. A fé em Deus é o ingrediente fundamental e necessário para seguir em frente. Mas ter acompanhamento psiquiátrico e o apoio da família também.

E assim, ela encontra forças até para ajudar outras mães que enfrentam o mesmo trauma.

– Seguir em frente dói demais. Seria mais fácil ficar com meus filhos agora, apressar esse encontro. Mas tem muito jovem precisando de ajuda e é isso que estou fazendo. Só na minha cidade, neste ano, quatro se mataram. Por isso, criei um projeto, Amor em domicílio, em que vou ao encontro de mães que estejam passando pelo mesmo problema. Também atendo por Skype. Estou tentando conseguir atendimento psicológico gratuito para elas também – relata.

PEÇA AJUDA
No Brasil, o Centro de Valorização da Vida (CVV) é uma das instituições que dão apoio emocional e trabalham para prevenir o suicídio. Para pedir ajuda ligue para o número 188 ou acesse o site do CVV.

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