O turismo, o Museu Nacional e a boate Kiss
Virgínia Martin - 04/09/2018 09h59 | atualizado em 04/09/2018 21h38

Os sábios populares já diziam: “Depois de arrombada a porta é que se troca a fechadura”. E assim segue a rotina nacional. A destruição total do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, é apenas mais um exemplo nessa logística da administração, seja de recursos públicos ou privados.
O Pleno.News, como ferramenta de comunicação, gosta de reavivar a memória. E, portanto, lembra de registros que também exemplificam este modus operandi que conduz a “tragédias anunciadas”. Quem não se lembra do incêndio da boate Kiss, na cidade de Santa Maria, interior do Rio Grande do Sul, em 2013? Após a morte de centenas de jovens, novas leis e maior fiscalização foram concretizadas no país para que estabelecimentos públicos funcionassem com maior segurança. Vamos ver até onde funciona.
Em 2011, foi a vez da Região Serrana do Rio de Janeiro sofrer com as chuvas que a cada ano assolam as cidades locais. Naquele ano, os prejuízos acumularam mortes, destruição de bairros, pessoas desabrigadas. E a história se repete anualmente, em maiores ou menores proporções. Em maio deste ano, um prédio de 26 andares e totalmente abandonado, desabou no centro da capital paulista. A prefeitura contabilizou que mais de 50 edifícios na cidade estavam em condições semelhantes. Em 2007, foi a vez do aeroporto de Congonhas revelar suas falhas e falta de infraestrutura no sistema aeroportuário. Como consequência, 187 pessoas morreram em um desastre com uma aeronave da TAM.
Enfim, por que a fechadura não foi trocada antes da porta ser arrombada? Por que apenas e sempre após essas calamidades, providências passam a ser tomadas e investimentos são prometidos? Por que o brasileiro não consegue ser proativo em gerenciamento de riscos?
Pois bem, o que se perdeu com essas tragédias jamais será recuperado. Gente morta que não volta nunca mais e, no caso do museu, registros históricos viraram pó. Enquanto isso, o Governo Federal tem um gasto de aproximadamente 1 trilhão de reais por ano, incluindo todas as suas despesas. Será que a administração pública não analisou a possibilidade de antever um risco calculado e alocar, ao menos, uma parte desse valor ao patrimônio nacional? A ex-casa da família real portuguesa sequer tinha seguro.
Hoje, confesso que ando preocupada com a Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Já olho para certos prédios e relíquias históricas com certo pesar e alerta. A Casa da Marquesa de Santos, que abriga o Museu do Primeiro Reinado, também em São Cristovão, há dez anos era um lugar onde era possível almoçar em seus jardins. Ali eu fazia minha refeição ao lado das árvores e relaxava. Atualmente, passo em frente ao prédio, bem próximo da Quinta da Boa Vista, e vejo apenas descuido e abandono.
Continuo minha reflexão. Penso que o turismo é atraído pelo aspecto histórico de um país e de uma cidade. Nem preciso comentar os desdobramentos sobre o que isto significa neste momento. E reforma, restauração ou verba alguma vai conseguir recuperar uma instituição científica de referência no mundo, fundada em 1818. O momento é de luto, de cobrança e, prioritariamente, de mudança de perfil administrativo de quem quer que seja neste país tão carente de memória.
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Virgínia Martin é editora-chefe do Pleno.News. Formada em Jornalismo, com pós-graduação em Propaganda e Marketing, em Comunicação Empresarial e em Pedagogia, tem mestrado em Multimeios. |
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