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Suicídio: Como ajudar aqueles que passam pelo luto?

Psicólogas falam sobre o difícil momento de seguir em frente

Rafael Ramos - 23/09/2019 18h00

No mês dedicado à prevenção do suicídio e valorização da vida, também é importante destacar o outro lado da história daquele que tirou a própria vida: os que ficaram, ou como define a Psicologia, os sobreviventes. Afinal de contas, como seguir em frente diante da perda de forma tão violenta? Como entender o que poderia ter sido feito para evitar? E o mais difícil: como seguir em frente?

A psicóloga especialista em família, Renata Bento, diz que o efeito do suicídio em uma família é devastador devido à herança muito dura a ser recebida para quem fica. A culpa e a raiva são sentimentos que surgem e permanecem e, numa fase em que a pessoa tem que lidar com muitas perguntas sem respostas, o assunto vira um tabu na família.

– É preciso ajudar a pessoa que ficou para que possa falar sobre o assunto, ajudar a quebrar o silêncio, sair do torpor e fazer movimentar-se por dentro para que a elaboração psíquica ocorra. Encorajar a pessoa a buscar ajuda especializada. Entrar em processo de terapia pode ser de grande ajuda – disse Renata, que é membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro, ao Pleno.News.

Renata destaca que “passamos a vida experimentando lutos” quando, por exemplo, uma criança precisa fazer o luto de um lugar idealizado junto aos seus pais quando recebe um irmãozinho. Em outras palavras, o luto “é um vazio promovido pela perda de alguém ou de algo importante e significativo”.

– É um processo psíquico importante diante de algo que invade o sujeito de forma inesperada deixando-o por um período sem possibilidade de construção narrativa. Justamente por isso o luto é um tempo necessário para a elaboração psíquica e por isso mesmo é fundamental atravessar o luto. Didaticamente, pode-se dizer que se oscila em cinco fases, que não são exatamente em uma sequência. Podem ocorrer muitas oscilação entre elas e ainda misturadas uma a outra.

Fase 1 – Negação ou desorientação ou torpor: Momento confuso onde a pessoa se sente perdida e se desestrutura. Nessa fase surge a negação ou tentativa de evitar entrar em contato com a realidade como mecanismo de defesa psíquica;
Fase 2 – Raiva: É a fase de anseio e busca da figura perdida, onde surge o choro como mecanismo adaptativo e a tentativa de se vincular novamente com a figura ou ideia perdida. E aí surge a raiva porque a pessoa se sente injustiçada e se revolta contra tudo que a cerca;
Fase 3 – Barganha: A pessoa começa a fazer promessas a si mesma, ou a uma entidade, de que irá sair dessa, de que será melhor, de que sua vida mudará para melhor;
Fase 4. Depressão, desespero e dor profunda: A quarta fase é bem complicada porque os sentimentos de vazio e perda se intensificam e a pessoa se sente impotente, desmotivada, apática, deprimida e pode se isolar. Podem surgir distúrbios psicossomático, por exemplo, ligados à alimentação, como perda do apetite;
Fase 5 – Aceitação e reorganização: O mundo interno começa a se organizar, cessa o desespero, a dor encontra um lugar dentro da pessoa que não mais a invade na totalidade. É a fase final do processo de luto. A vida começa a ser reorganizada e a pessoa já consegue vislumbrar novos projetos, novo relacionamento, novo emprego, etc. A esperança retorna mostrando que a vida continua.

ATENDIMENTO À FAMÍLIA
A psicóloga Renata Bento ainda explica que o tipo de constituição emocional de cada um vai definir qual a melhor forma de ajudar o sobrevivente. A experiência do luto é individual e cada um tem sua forma singular de lidar com o sofrimento causado pelas perdas.

– O luto, não é algo patológico, mas seus sintomas são semelhantes aos da melancolia e depressão. O que irá diferenciá-los é a intensidade e o tempo de duração. O luto é algo que precisa ser atravessado. Com o tempo, a pessoa vai adquirindo mais contato com a realidade através da elaboração psíquica e tende a reorganizar o mundo interno que irá refletir no externo. É preciso que se tenha paciência e respeito pela dor do enlutado porque cada um tem seu tempo para superar. O processo de luto faz chorar e gera sintomas muito dolorosos – resume.

Já a psicóloga Priscila Costa Ramos Campos, especialista em psicodiagnóstico e cuidados paliativos, além de atuar na área de luto e processo de suicidologia, realiza um trabalho específico para os sobreviventes chamado de posvenção. Há três anos, Priscila é proprietária do Centro de Apoio ao Sujeito no Luto (Casulu), em Fortaleza (CE), onde promove atendimento clínico individual aos sobreviventes, além de realizar cursos, palestras e rodas de conversa.

O sobrevivente é capaz de sobreviver a dor de perder alguém para o suicídio, mas sabemos que alguns comportamentos podem ser perpetuadas no seio familiar e, principalmente, pelo que não é dito e que fica enraizado na estrutura familiar que vai se construindo. As pessoas que tiram a própria vida estão em uma condição emocional bem destoante da normalidade para ela e 90% dos casos estão atrelados a algum tipo de transtorno mental. Então a posvenção previne que algo possa se repetir nessa família – declarou ao Pleno.News.

Ao longo dos anos com esse trabalho, Priscila disse que já viu pessoas transformarem toda a dor do luto em amor e ajudar outras pessoas a superarem essa fase. É comum que a morte traga consigo a culpa e questionamentos, mas, além do tratamento especializado, ela também acredita que a fé pode ser um alento nessas horas.

A própria fé é muito importante para que a gente observe a morte de uma forma diferente. Muitas congregações pregam que existe uma vida após e o querer esperar por essa vida que vem depois é a fé. Então, se existe uma possibilidade que seja feito um reencontro, a fé vai ajudar bastante.

Renata Bento afirma que ter fé na vida apesar de tudo ajuda a seguir em frente buscando novas alternativas para trabalhar os aspectos emocionais na terapia. Essa fé é algo interno e singular que impulsiona a viver.

– Outro aspecto é a questão da fé religiosa. Se, por exemplo, a morte não faz nenhum sentido, a religião fornece essa sensação e pode aliviar a dor. É algo em que a pessoa se apega para buscar algum conforto. Ademais, o suicídio de um membro da família é uma herança emocional difícil de se receber.

BUSQUE AJUDA
No caso de familiares enlutados, o Centro de Valorização da Vida oferece por meio do CVV Comunidade, os Grupos de Apoio aos Sobreviventes do Suicídio. É importante ressaltar que os grupos servem a encontros que partilham emoções e criação de laços afetivos, mas não substituem a assistência especializada, ou seja, a terapia é indispensável. Os locais com os grupos de apoio estão localizados em todo Brasil e a lista das cidades com seus endereços podem ser encontradas através do site cvv.or.br.

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