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O cristão e o perigo das meias-verdades – Parte 2

Não propagar verdades que não podem ser provadas evita grandes constrangimentos. É necessário muita prudência antes de falar

Gilberto Garcia - 02/11/2017 12h00

O exercício de abstinência no propagar verdades que não se pode provar é indispensável ao cidadão, sobretudo, ao cidadão cristão, e evitaria grandes constrangimentos, como no fato ocorrido há alguns anos, no qual uma Igreja Evangélica excluiu um membro, que para efeitos da Lei Brasileira, é um associado eclesiástico, de seu rol de membros, à luz do Estatuto Associativo da Organização Religiosa.

Os líderes registraram que havia suspeitas de adultério levantadas pela esposa do excluído, no que foi acompanhada por alguns “piedosos” irmãos, situação que, mutatis mutandis, proporções e peculiaridades guardadas, se aplica a qualquer organização associativa, seja: religiosa, sindical, esportiva, cultural, profissional, de moradores, beneficente, acadêmica, filosófica, empresarial, científica, política etc.

O referido irmão deu queixa da acusação na Delegacia de Polícia, e aquela Igreja Evangélica, através de seu Pastor Presidente, foi convocada a explicar e ratificar diante da Autoridade Policial as insinuações pela quebra do sétimo mandamento, registradas em Ata que provocaram a exclusão daquele irmão.

Ocorre que em reunião com aqueles “piedosos” irmãos, nenhum deles, inclusive a esposa, possuía qualquer prova concreta para tão grave alegação. De forma que orientamos aquela Igreja a promover uma Assembleia de Retratação, corrigindo aquele equívoco praticado contra uma pessoa inocente.

Ciente da retratação (pedido de perdão público) promovida pela Igreja, aquele irmão exercitando espírito cristão – pois se quisesse poderia ter processado por danos morais – aceitou o pedido de perdão público, procedido em uma Assembleia, convocada especificamente para aquele fim, no mesmo dia e horário daquela que o havia excluído. Assim, aquele irmão retirou sua queixa na Delegacia de Polícia, bem como, foi congregar, juntamente com sua família em outra Igreja Evangélica, podendo cultuar a Deus em paz.

Assim é prudente aos líderes comunitários, inclusive para resguardo legal das organizações associativas, sobretudo às religiosas, que, ao receberem acusações acerca da vida alheia, independentemente de quem seja o portador, orientar que este escreva o que está dizendo, assine, e que consiga, no mínimo, duas ou três testemunhas, com suas respectivas assinaturas, preferencialmente com o reconhecimento da firma de todos os insinuadores em Cartório, comprometendo esses acusadores, à luz do Livro de Deuteronômio 19:15: Uma só testemunha não se levantará contra alguém por qualquer iniquidade, ou por qualquer pecado, seja qual for o pecado cometido; pela boca de duas ou de três testemunhas se estabelecerá o fato, pois é a partir desse momento que inicia-se, legalmente, o processo disciplinar numa Igreja.

Temos ouvido que essa forma de agir é burocrática, e concordamos; exatamente porque dá trabalho e expõe quem acusa e, consequentemente, dá credibilidade ao conteúdo compartilhado, incentivando a prática do “confronto bíblico”, além da mesma ter fundamentação bíblica, com base no Evangelho de Mateus 18:15-17: Se o seu irmão pecar contra você, vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro. Se ele o ouvir, você ganhou seu irmão. Mas se ele não o ouvir, leve consigo mais um ou dois outros, de modo que qualquer acusação seja confirmada pelo depoimento de duas ou três testemunhas. Se ele se recusar a ouvi-los, conte à igreja; e se ele se recusar a ouvir também a igreja, trate-o como pagão ou publicano.

Através dessa metodologia bíblica evita-se que insinuações despropositadas, não comprovadas, e, às vezes, com intenções inconfessáveis, às quais provocam, sobretudo neste tempo de redes sociais famintas por novidades perversas, a execração de pessoas, atingindo-lhes a dignidade como pessoa humana, incluindo-se aí seu bom nome, sua imagem social, sua honra e sua moral pública na sociedade, tendo efeito muito mais potente quando praticado com integrantes de uma Comunidade de Fé.

Como, inclusive, noticiado pela imprensa carioca, a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, “(…) que deu ganho de causa à vítima da fofoca em Igreja Evangélica, que receberá R$ 5 mil de indenização de cada um dos fofoqueiros. Na ação judicial, a pessoa exposta afirmou que dois irmãos, sob a alegação de terem recebido uma “revelação divina”, estavam espalhando o boato para os demais membros da igreja de que ela teria traído o marido. (…)”, nesse caso, como em outros, aplica-se objetivamente a exortação do Apóstolo Paulo no Livro de Romanos. 13:3,4: Porque os magistrados não são motivo de temor para os que fazem o bem, mas para os que fazem o mal. Queres tu, pois, não temer a autoridade? Faze o bem, e terás louvor dela; porquanto ela é ministro de Deus para teu bem. Mas, se fizeres o mal, teme, pois não traz debalde a espada; porque é ministro de Deus, e vingador em ira contra aquele que pratica o mal.

Esses bens imateriais são considerados legalmente patrimônio personalíssimo do insinuado, sendo protegidos pela Constituição Federal e pelas Leis do Brasil, resultando em processos judiciais e condenações pecuniárias, como já tem ocorrido em diversas Organizações Comunitárias, especialmente, religiosas pelo país, por falta de cuidado ao expor vexatória e publicamente perante a Igreja a privacidade da vida das pessoas, independentemente da comprovação ou não da insinuação ao fiel, ou, membro da Igreja.

Entre outros clubes de serviços, como o Rotary Club Internacional, que reúne empresários, executivos e profissionais liberais, líderes de suas categorias, divulga-se a chamada Prova Quádrupla, criada em 1912, por Herbert Taylor, do Rotary Club de Chicago, EUA, que veio a se tornar presidente Rotary Club Internacional.

A PROVA QUÁDRUPLA, do que nós pensamos, dizemos ou fazemos:

  1. É a VERDADE?
  2. É JUSTO para todos os interessados?
  3. Criará BOA VONTADE e melhores amizades?
  4. Será BENÉFICO para todos os interessados?

Há algum tempo o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, manteve condenação por DANOS MORAIS, a uma Empresa Jornalística, por DIVULGAÇÃO DE NOTÍCIA CALUNIOSA E DIFAMANTE, À HONRA PESSOAL, sobre o ABUSO DO DIREITO DE INFORMAR, “(…) pela falta do dever de cuidado de pesquisar antes de divulgar (…)”.

É de se destacar uma decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, “(…) que manteve a sentença que condenou jornal e jornalista que, extrapolando no direito de informar, feriram a honra e a imagem de uma procuradora municipal. Ambos personalizaram o debate sobre atos da administração municipal e atingiram a privacidade da procuradora, faltando com o dever de cautela. (…)”.

No final do mês de outubro, no dia 27, o Superior Tribunal de Justiça, mais uma vez ratificou entendimento, inclusive à Impressa, do indispensável zelo noticiador: “Editora e jornalista devem indenizar empresário por conteúdo ofensivo de obra”. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) que condenou uma editora e um jornalista ao pagamento de indenização por danos morais de R$ 124,5 mil ao diretor-presidente de uma empresa siderúrgica. O motivo foi a publicação de um livro com conteúdo considerado ofensivo à imagem do empresário. (…)” “(…) O relator do recurso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, enfatizou que o sistema jurídico assegura aos profissionais da informação o direito à liberdade e à crítica, no entanto, no desempenho da função jornalística, deve-se atentar ao compromisso com a verossimilhança dos fatos, à narrativa equilibrada entre os posicionamentos e à manifestação de opiniões sem que ofenda a honra da pessoa criticada. (…)” (grifo nosso).

Enfatiza o ministro, acompanhado pela 3ª Turma do STJ: “(…) Excede o direito à livre manifestação de pensamento e o direito de informação, ingressando no terreno do abuso de direito (artigo 187 do Código Civil), a ofensa à honra e à imagem daquele a quem imputados adjetivos ofensivos sem relação com os fatos, que são objeto da narrativa literária, não consubstanciando debate intelectual de qualquer natureza”.

Que, com a graça de Deus, sejamos instrumentos de bênçãos, na vida daqueles que nos rodeiam, praticando uma salutar ética cristã, de evitar as meias-verdades, mas sim da propagação da verdade, inclusive se ela passar no “Modelo Bíblico”, que é o mesmo do “Crivo da Lei” das duas ou três testemunhas; no “Teste das Três Peneiras” de Sócrates, e ainda, na “Prova Quádrupla” de Rotary Club Internacional.

Para que em meio à nossa sociedade, tão carente de valores éticos, morais e espirituais possamos ajudar outros a não incorrer nessa forma ilegal de atuação, e aí entender as recomendações da cultura judaico-cristã, em seu Livro Sagrado, a Bíblia, que assevera: Com a mesma medida que medires, havereis de ser medidos… (Lucas 6:38); e sujeitos a Lei dos Homens, que exige de quem acusa a respectiva prova concreta do alegado, eis que, pela Constituição Federal o cidadão é inocente até que se prove em contrário.

Devendo, em nossa ótica, ser condenado social, judicial e financeiramente, quem levianamente propaga meias-verdades acerca da vida das pessoas, que tem garantida sua privacidade pessoal, familiar, profissional etc, nos termos da Lei brasileira, sob pena de arcar com pesada indenização pecuniária por danos morais, além da reprovação social, ética e moral; o que certamente contribuirá para que as pessoas evitem propagar meias-verdades (atualmente denominadas de fakes), objetivando um vida saudável em sociedade, propiciando o respeito e a harmonia tão necessária em nossos turbulentos dias.

 

Gilberto Garcia é advogado, pós-graduado e mestre em Direito. Professor universitário e Presidente da Comissão Especial de Direito e Liberdade Religiosa do IAB (Instituto dos Advogados Brasileiros).
* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.
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