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Lei Áurea, que permitiu fim da escravidão, completa 130 anos

O documento, no entanto, não acabou com o preconceito racial

Gabriela Doria - 12/05/2018 19h30

Página Senti Na Pele apresenta relatos de problemas enfrentados pela população negra Foto: Divulgação/Ernesto Xavier

Neste domingo (13), a Lei Áurea assinada pela princesa Isabel completa 130 anos. O fim da escravidão, no entanto, não acabou com o preconceito, sofrido principalmente pela população negra.

Uma página no Facebook decidiu tocar neste ponto bastante delicado e expõe relatos de racismo narrados por internautas, além de textos jornalísticos, vídeos, crônicas e denúncias. O jornalista e ator Ernesto Xavier, de 33 anos, contou que a ideia da página Senti Na Pele surgiu quando um de seus textos sobre o assunto se tornou viral nas redes.

– Eu falava sobre o genocídio da juventude negra, o medo de ser negro, de ser linchado, de tomar um tiro enquanto corria na praia. Depois disso, muita gente veio falar comigo, tanto para xingar quanto para contar suas histórias. Eu percebi que existia uma necessidade das pessoas falarem sobre as experiências delas com o racismo, coisas que elas guardavam a vida inteira. Lançamos a página e acabou crescendo. As pessoas começaram a enviar seus próprios relatos e assim ela foi se alimentando. Cada história encorajava outra pessoa a fazer o mesmo – afirmou Ernesto.

Ernesto também revelou que, no início, o objetivo da página era apenas expor os depoimentos, mas acabou se tornando algo ainda maior.

– No início, a ideia era contar essas histórias, que foram silenciadas por muito tempo. Mas depois a página se tornou uma rede de afetos, porque ali as pessoas se ajudavam, se sentiam mais encorajadas. Elas passaram a não se sentirem sozinhas no mundo. É uma rede de sociabilidade, tanto de pessoas negras como de pessoas não negras. Elas vão ali para aprender a ter empatia – ressaltou o jornalista – a gente se sente muito melhor depois que conta as coisas, isso alivia.

Como criador da página, Ernesto diz que já se deparou com todos os tipos de testemunhos, mas o que mais marcou ele foi o de uma jovem negra, que hoje é sua amiga.

– Ela contou que sofria violência de um menino da escola e que ele direcionava essa violência somente para os alunos negros. Um dia, esse menino aprendeu artes marciais e bateu muito na minha amiga. Ela foi parar no hospital, mas o menino continuou na escola porque a família dele dava dinheiro para a escola. Minha amiga teve que sair da escola e hoje não pode engravidar, porque as pancadas que recebeu provocaram um deformação no ovário. Então, ela sofre com isso constantemente, porque ela teve que se transformar dentro dessa adversidade que ficou no corpo dela.

A Senti na Pele cresceu tanto que se tornou livro e também o tema da dissertação do mestrado de Antropologia de Ernesto.

Página ganhou tanta proporção que se tornou livro Foto: Divulgação/Ernesto Xavier

– A intenção é ir para todos os tipos de espaço e para a academia. Um espaço onde são brancos que falam sobre negros. Agora é um negro que fala sobre negros. A questão do lugar de fala é muito importante – destacou o criador da página.

Mas, apesar dos avanços conquistados pela população negra e da intensificação dos debates sobre o racismo, Ernesto acredita que ainda há muito o que se percorrer para alcançar a igualdade.

– O debate vem crescendo, mas ainda estamos anos-luz distantes de uma sociedade sem racismo. Principalmente porque as pessoas não sabem o que é o racismo. Elas acham que é só o xingamento. Essas são as manifestações que são expostas, mas aquilo que está na estrutura não é debatido. Eu percebo que não só por causa das páginas, mas pelos movimentos negros que têm obrigado o debate a ser levado adiante. Esse trabalho de formiguinha é o caminho – concluiu Ernesto.

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