Leia também:
X Câmara decide rumo de 2ª denúncia contra Michel Temer

Senador Cristovam Buarque responde Marco Feliciano

Os parlamentares divergiram sobre a presença de uma criança na performance La Bête

Pleno.News - 25/10/2017 13h31 | atualizado em 25/10/2017 23h42

Senador Cristovam Buarque Foto: Divulgação

O senador Cristovam Buarque divulgou um texto no qual responde ao deputado federal Marco Feliciano. Na última semana, Feliciano publicou em sua coluna no Pleno.News o artigo intitulado “Senador Cristovam Buarque e a “arte” sem censura“.

Marco Feliciano lamentou que Cristovam Buarque tenha criticado os que denunciaram a exposição de uma criança a um homem nu, na performance La Bête, no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Contudo, o senador optou por explicar o seu posicionamento.

Leia na íntegra o texto do senador Cristovam Buarque:

Prezado Pastor e deputado Marco Feliciano,

Nos últimos dias, tomei conhecimento de críticas feitas a mim por pastores evangélicos, com relação à minha frase: “a censura começa contra a nudez, depois impõe a mudez”. Apesar de provocada por sucessivas imposições ou propostas de censura contra cultos afro-brasileiros, discursos políticos e manifestações artísticas, fiz a frase como alerta, no sentido genérico, do risco de um primeiro passo na direção da censura, que em pouco tempo poderá ser usada para práticas autoritárias, tolhendo a liberdade política, artística, de opinião e mesmo religiosa. Por respeito à comunidade evangélica, com a qual sempre tive relações muito respeitosas, apesar de discordâncias eleitorais com alguns de seus líderes, decidi responder a seu artigo.

Em primeiro lugar, porque nunca vi seu nome envolvido em qualquer polêmica que não fosse por razões de crença ou visão ética. Em segundo lugar, escolhi responder ao senhor pela rara postura que demonstrou ao escrever uma carta crítica, sem deixar de reconhecer o mérito na pessoa criticada. No sectarizado Brasil de hoje, as pessoas são tratadas como santos ou demônios, e o senhor teve a delicadeza de começar seu artigo com a generosidade de elogios à minha pessoa, até para ter mais argumentos para cobrar de mim uma explicação sobre a frase citada.

Sobre isso venho respeitosamente a V. Exa, Deputado e Pastor, e à comunidade evangélica, dizer que:

1. A frase foi postada depois de diversas manifestações de prática ou de defesa de censura, em diversas partes do Brasil. Estas tentativas trazem o risco de que tratei, de maneira genérica, na referida frase. Defendo, como acredito que o senhor também, a ampla liberdade de expressão. Considero que todo gesto vanguardista é repudiado no momento que surge, seja nas artes, nas ideias e até nas religiões. Mas devo dizer que não vi valor estético nem arte no caso da exposição do corpo nu de um homem vivo, tampouco se fosse um cadáver, no chão de uma sala de museu em São Paulo. Mas é exatamente por não ver criação artística por trás daquele “objeto” exposto, que sou contra censurar aqueles que consideram como obra de arte o que eu vejo apenas como um objeto e até de mal gosto. Respeito a ideia de que a beleza é o resultado do artista e de sua obra, mas também é produto da percepção do observador. Se formos proibir o que eu, o senhor ou o Estado consideram como “não-obra”, talvez estejamos impedindo o avanço de padrões estéticos que mudam com o tempo.

2. Não me vejo no direito de censurar aqueles que veem arte onde eu não vejo; mas considero reprovável a participação ou simples presença de uma criança brincando em uma performance ao lado de um corpo nu. Considero um erro grave o fato dos organizadores daquela exposição e dos responsáveis pela criança não terem atentado às regras de classificação etária para exibições artísticas. Essa classificação deve ser levada em conta não apenas por razões morais, mas também pedagógicas e psicológicas, porque estudos mostram que a exposição a certos fatos, como violência, drogas, doutrinas, sexo antes da idade certa, pode provocar sequelas na mente da criança.

Por essa razão, eu discordo da opinião de que a educação de uma criança deve ser assunto exclusivo da família. Creio que o Estado deve ser também instrumento de proteção às crianças diante de pais agressivos ou irresponsáveis. A classificação etária tem esse propósito, sem censurar a manifestação artística, de proteger as crianças diante de espetáculos que não condizem com a maturidade correspondente à sua idade, conforme a cultura em que são criadas.

Finalmente, fico satisfeito com sua preocupação com o combate à pedofilia sexual, mas lembro que a pedofobia social também é um fato grave e se manifesta de maneira muito generalizada, sob a forma de castigos, fome, desaparecimento, falta de atendimento médico, tráfico de órgãos, abandono familiar, negação de escola com qualidade, violência, assassinato de crianças. É positivo que, graças a pessoas como o senhor e a CPI liderada pelo Senador Magno Malta, o Brasil esteja descobrindo e se opondo ao horroroso crime da pedofilia, mas é preciso despertar para a pedofobia que caracteriza a sociedade brasileira sob os olhares tolerantes de todos nós, inclusive daqueles que, corretamente, lutam contra a pedofilia.

Pastor e Deputado Feliciano, obrigado por suas palavras a meu respeito, por sua cobrança a uma posição minha, que tentei responder nesta carta, colocando-me à sua disposição para continuar o debate e para sabermos como barrar a monstruosidade individual da pedofilia sexual e a monstruosidade política da pedofobia social, e ao mesmo tempo como levar adiante essas duas lutas dentro de uma sociedade tolerante e livre.

Siga-nos nas nossas redes!
Telegram Entre e receba as notícias do dia Entrar no Grupo
O autor da mensagem, e não o Pleno.News, é o responsável pelo comentário.