Por 7 a 4, CPI aprova relatório com indiciamento de Bolsonaro
Presidente foi acusado de ser o responsável pelo agravamento da pandemia de coronavírus
Pleno.News - 26/10/2021 21h31 | atualizado em 27/10/2021 10h31
A CPI da Covid aprovou seu relatório final nesta terça-feira (26), após seis meses de trabalho, e manteve o foco no pedido de indiciamento de Jair Bolsonaro. O presidente é acusado de ser o responsável pelo agravamento da pandemia de coronavírus, que “deixou mais de 600 mil mortos” no país.
Com 1.288 páginas, o relatório do senador Renan Calheiros (MDB-AL) – que passou com um placar de sete votos a favor e quatro contrários – também pede o indiciamento de mais 77 pessoas e de duas empresas.
– Há um homicida no Palácio do Planalto – disse Renan, em um duro discurso no qual afirmou que Bolsonaro agiu como “missionário enlouquecido para matar o próprio povo”.
Em seu último discurso, o senador afirmou que “bestas feras” tentaram ameaçar a CPI, mas não obtiveram sucesso.
Votaram a favor do relatório que agrava a crise do governo os senadores Eduardo Braga (MDB-AM), Humberto Costa (PT-PE), Omar Aziz (PSD-AM), Otto Alencar (PSD-BA), Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Tasso Jereissati (PSDB-CE), além do próprio relator.
Já os votos contrários vieram dos senadores Eduardo Girão (Podemos-CE), Jorginho Mello (PL-SC), Luis Carlos Heinze (PP-RS) e Marcos Rogério (DEM-RO).
No caso de Bolsonaro, o texto final aprovado pede o indiciamento do presidente por nove crimes. Os crimes comuns nos quais ele é citado são: epidemia com resultado morte; infração de medida sanitária; charlatanismo; incitação ao crime; falsificação de documento particular; emprego irregular de verbas públicas e prevaricação, conforme definidos pelo Código Penal; os crimes contra a humanidade são de extermínio, perseguição e outros atos desumanos, arrolados no Tratado de Roma, do qual o Brasil é signatário.
A CPI ainda pediu o indiciamento de Bolsonaro por crimes de responsabilidade: violação do direito social e quebra de decoro do cargo.
A lista encabeçada por Bolsonaro segue com os pedidos de indiciamento de seus três filhos com carreira política – o senador Flávio (Patriota-RJ), o deputado Eduardo (PSL-SP) e o vereador carioca Carlos (Republicanos).
O texto também pede o indiciamento de empresários apoiadores de Bolsonaro, jornalistas de direita que teriam disseminado desinformação na pandemia, dirigentes do Ministério da Saúde e especialistas que integraram o chamado “gabinete paralelo”, núcleo de assessoramento do presidente durante a pandemia.
As últimas mudanças no relatório de Renan foram decididas em uma reunião do grupo majoritário da CPI, na noite de segunda-feira (25). O encontro, realizado no apartamento funcional do presidente da CPI, o senador Omar Aziz (PSD-AM), estendeu-se pela madrugada. Na ocasião, os senadores decidiram pela inclusão do governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), no rol de indiciados, e do ex-secretário de Saúde, Marcellus Campêlo, entre outros.
Antes das inclusões, o número de indiciados era de 70 pessoas. Várias delas tiveram seus nomes incluídos e removidos do relatório nas sucessivas versões. A última leva de indiciamentos foi patrocinada pelo vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
Na manhã desta terça, a lista chegou a 79 pessoas. Renan Calheiros incluiu o senador Luis Carlos Heinze entre os indiciados. Depois, atendendo a uma questão de ordem de Alessandro Vieira, o nome do gaúcho acabou sendo retirado da lista. Ao incluir o colega de CPI, o alagoano disse que Heinze “reincidiu” na divulgação de informações falsas.
– Pela maneira como incitou o crime em todos os momentos, eu queria, nesta última sessão, dar um presente à vossa excelência: […] será o 81º indiciado desta comissão – disse o relator, anotando em seguida o nome de Heinze no relatório, à caneta.
A participação de Heinze na CPI ficou marcada pela defesa de teses como uma eficácia do “tratamento precoce”, na cidade de Rancho Queimado (SC).
O relatório da CPI deve ser apresentado ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG), na manhã desta quarta-feira (27). Depois, as conclusões da comissão serão enviadas ao Ministério Público. A parte que diz respeito a Bolsonaro será encaminhada à Procuradoria-Geral da República (PGR); outras partes da apuração serão apresentadas às unidades do MPF nos estados e aos MPs de cada unidade da federação, a depender do tipo de crime e das pessoas envolvidas.
Uma reunião dos senadores da CPI com o procurador-geral da República, Augusto Aras, também está marcada para a manhã desta quarta (27). Semanas atrás, Aras disse que tomaria providências e que não seria omisso diante dos fatos levantados pela comissão.
Caso o procurador-geral da República não dê sequência às investigações, os integrantes da CPI estudam ingressar com uma ação penal privada subsidiária no Supremo Tribunal Federal (STF)
Segundo o advogado criminalista Fernando Castelo Branco, o pedido de indiciamento da CPI é diferente daquele feito pela polícia.
– A CPI é um poder investigatório, criado para apurar fatos e a responsabilidade por esses fatos. O efeito prático [do pedido de indiciamento] é dar, no relatório final, um destaque para esses personagens. No final, caberá ao Ministério Público proceder ao acolhimento ou não dessas acusações, para fazer uma denúncia [formal] – diz ele, que é professor de processo penal no curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
O vice-presidente do colegiado, Randolfe Rodrigues, falou sobre os trabalhos da CPI.
– O que motivou esta Comissão Parlamentar de Inquérito foi, em janeiro deste ano, vermos irmãos morrendo. Foram […] as trágicas cenas de Manaus. Foram as filas do desespero pelos cilindros de oxigênio […] Quantas mesas de jantar nas casas das famílias brasileiras estão incompletas no dia de hoje por causa do descaso? Já foi dito aqui: pelo menos 200 mil irmãos nossos poderiam estar entre nós. Quantos amigos e parentes não poderiam estar neste momento na sala de TV assistindo à conclusão deste trabalho? E isso não foi por acaso: teve responsabilidade [do governo federal] – ressaltou.
O senador Alessandro Vieira também fez comentários.
– O crime central que encontramos foi fartamente demonstrado: o crime de epidemia agravado pelo resultado morte […]. É evidente que o presidente da República não criou o vírus, mas é tão evidente [o] quanto que o presidente se esforçou para acelerar a propagação do vírus – destacou.
RELATÓRIO ACUSA SEM PROVAS, DIZ GOVERNISTA
Ao justificar seu voto contrário, o senador Marcos Rogério disse que o relatório de Calheiros era “fake news processual”.
– Voto contra, primeiro, porque essa CPI se revelou um estelionato político e, segundo, porque o relatório, para mim, é um grande fake news processual. Estelionato porque esta CPI nasceu para investigar, mas não investigou, e protegeu acusados de corrupção nos estados e municípios. E o relatório é um grande fake news processual porque acusa sem provas e se ancora numa narrativa do jogo pré-eleitoral – disse ele.
Em sua última manifestação na CPI, o senador Flávio Bolsonaro leu uma relação de 21 crimes “supostamente cometidos” por Renan durante a pandemia, entre eles o de “perseguição”. O senador também disse que o relatório final era uma “peça política” e defendeu o governo de seu pai comparando-o ao de Dilma Rousseff (PT).
Mesmo votando contra o relatório, o senador Eduardo Girão admitiu que Bolsonaro errou ao provocar aglomerações e ao “dar declarações infelizes sobre a vacina”.
– Errou, sim. Mas esse relatório [de Renan Calheiros] se perdeu, errou a mão. E isso deslegitima até algumas coisas que poderiam ser vistas com seriedade. Ultrapassou o limite de uma vingança pessoal, regional, com interesses políticos. Isso ficou evidente – observou ele.
*AE
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