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Maestros rebatem declarações do novo presidente da Funarte

Dante Mantovani levanta discussão sobre gêneros musicais

Rafael Ramos - 05/12/2019 17h41 | atualizado em 05/12/2019 19h37

Dante Mantovani foi nomeado como presidente da Funarte

Nomeado para assumir a presidência da Fundação Nacional de Artes (Funarte), o maestro Dante Mantovani é graduado em Música e se especializou em Filosofia Política e Jurídica, além de ser mestre em Linguística. Desde fevereiro de 2016, Dante mantém um canal no YouTube que ele define como “conservador que reúne música, cultura, notícias e entrevistas”.

Uma semana antes de ser nomeado pela Secretaria de Cultura, o maestro deletou seus perfis no Facebook, Twitter e Instagram. Entretanto, algumas de suas declarações no YouTube geraram discussões nas redes sociais.

Em um dos vídeos, por exemplo, intitulado “Quem inventou a música?”, publicado em dezembro de 2018, o atual presidente da Funarte desfere ataques a Rede Globo e afirma que Deus é o inventor da música, que foi corrompida pelo diabo. Em outro vídeo, que conta com mais de 26 mil views, Dante relaciona o rock com as drogas, o sexo, a indústria do aborto e o satanismo.

Como forma de esclarecer esses temas, o Pleno.News conversou com três maestros: Jonas Paulo Silva, que é produtor musical graduado em Composição e Regência pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) e atua como maestro e arranjador do espetáculo Hadassa – O musical, da Cia. Nissi; o presidente da Academia Brasileira de Música Evangélica e bacharel em Música Sacra e Teologia, José B. P. Cunha Jr, que é pastor de adoração na Primeira Igreja Batista do Parque Boa Esperança, na capital paulista, formado em Música Sacra pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo e bacharel em Teologia pelo Instituto Mundo Bíblicoque, e o maestro José Paulo Ferreira, regente de orquestra na Assembleia de Deus de Madureira, na cidade de Cosmópolis (SP).

Jonas Paulo Silva considera Mantovani um “Olavo de Carvalho da música” Foto: Arquivo Pessoal

Jonas afirma que vê com preocupação tais declarações do presidente da Funarte. O maestro acredita que cabe a ele gerir projetos de toda natureza e ligados seja à música clássica, à folclórica, às que não possuem cunho religioso e até àquelas ligadas a cultos que não sejam cristãos.

– O maestro Mantovani parece execrar qualquer produção artística que não seja flagrantemente cristã. Esses órgãos não devem ser geridos ideologicamente. Em resposta a uma pergunta de uma criança sobre quem teria inventado a música, ele responde inequivocamente: “Foi Deus!” Esta pode ser sua crença, mas dar força de fato científico ou constatação musicológica é bem equivocado. Baseado na leitura cristã da passagem de Ezequiel a partir da qual se depreende a queda de Lúcifer, o maestro Mantovani repete a tradição cristã na qual Lúcifer seria algo como que um maestro celestial antes de sua queda.

Sobre a relação entre rock, drogas, aborto e satanismo, Jonas Paulo ressalta que a demonização do gênero parte do imaginário popular. Ele se revelou preocupado com tais colocações vindas de alguém que atua como gestor de uma fundação de artes.

– O abuso de substâncias químicas está presente em diversos segmentos da sociedade. Tanto a questão do abuso de substâncias químicas quanto o aborto são problemas de saúde pública e não podem de forma alguma ser diretamente relacionado a este ou outro estilo musical. Na verdade, me preocupa muito nessas declarações o caráter sempre negativo das mesmas. Ficaria mais feliz com um presidente da Funarte que fosse notório por falas propositivas e cuja nomeação enchesse de esperança e ânimo os produtores de arte espalhados no Brasil. É triste ver tão difundida esta cultura do medo.

O maestro também critica a ideia de que um gênero musical muito rítmico fala mais ao corpo do que à alma. Segundo Jonas Paulo, tal separação entre corpo e alma traz consigo o pensamento de que tudo associado ao corpo seja pior, enquanto o que é ligado à alma é mais elevado.

– Isso é algo advindo, inclusive, de más leituras de ideias platônicas. Em seus vídeos, nos quais temos um desfile de etimologias de termos gregos para fortalecer seus pontos de vista, percebemos que suas declarações tem mais interesse em cumprir sua agenda ideológica do que de fato a pesquisa dos temas que aborda. Ele soa como o “Olavo de Carvalho da música” e não como um artista.

“Não é só o estilo musical que afeta a formação da pessoa”. diz Cunha Foto: Arquivo Pessoal

Corroborando com as afirmações de Paulo, o maestro Cunha afirma que essas ideias platônicas partem do pressuposto de uma doutrina filosófica chamada Ethos. A mesma diz que a música consegue interferir no caráter e no comportamento do ser humano.

– Platão dizia que se ouvirmos música adequada, seremos bons cidadãos, se não ouvirmos, não seremos. Eles atribuíam cada modo ou escala musical para ativar e induzir o comportamento desejado ao grupo, mas isso não é o todo. Não podemos esquecer que a humanidade foi corrompida e não é apenas o estilo musical que afeta diretamente a formação da pessoa. Nós vemos por aí os serial killers que cometem atrocidades ouvindo músicas clássicas. A nossa luta não é contra pessoas, mas contra principados, potestades, príncipes das trevas.

Ainda no vídeo “Quem inventou a música?”, Dante Mantovani responsabiliza o funk pelo aumento da violência. Para Cunha, não se pode julgar um fato de forma isolada, visto que a queda do homem corrompeu tudo o que existe.

– Definir música vai muito além do que a nossa sociedade e as igrejas entendem, mas não posso responsabilizar um ato isolado por toda violência que hoje passamos. Já que a referência é o funk e a cidade do Rio de Janeiro, podemos pensar: há 7 anos o metrô do Rio oferecia música clássica a seus passageiros durante seu percurso. Mas, como era o Rio de Janeiro no quesito violência nessa época? – indaga Cunha.

Jonas acredita que a arte pode influenciar a sociedade, mas considera excessivo atribuir a falência da segurança a um estilo musical.

– A arte é muito mais produto de seu contexto do que sua causadora. O poeta americano Ezra Pound diz que os poetas são as antenas da raça. O funk é um grito de excluídos contra diversas camadas de opressão e exclusão – afirma Jonas Paulo.

Entretanto, o maestro José Paulo Ferreira acredita que o gênero pode até não influenciar, mas o grande risco está na mensagem que muitas letras presentes no funk brasileiro carregam.

– Muitas pessoas usam esse gênero musical para passar uma mensagem errônea. Nesse caso, a música tem esse poder de induzir as pessoas a atitudes e decisões erradas porque trabalha no subconsciente. A pessoa ouve aquilo e acaba se tornando uma verdade para ela. O gênero não passa a mensagem, mas os autores sim, assim como pode ser no axé, no samba, no rap ou em qualquer outro gênero. Por isso, é muito importante escolher o que se ouve porque isso pode trazer benefícios ou malefícios para nossa vida – conclui.

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