Desembargador acusa guardas de abuso de autoridade
Após se negar a usar máscara e pagar multa, magistrado alegou abuso dos agentes
Pleno.News - 21/08/2020 13h29 | atualizado em 05/11/2020 12h31

O caso do desembargador Eduardo Siqueira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, que humilhou um guarda municipal após exigência para que usasse uma máscara de proteção na rua, repercutiu como um exemplo de abuso de autoridade. O estranho é que ambos os lados alegam tal violação ética.
De um lado está o fato de o autor da ação ser um desembargador da Justiça que rasgou a multa recebida por não aceitar usar máscara. Do outro lado está a defesa do desembargador, que aponta que os guardas municipais não têm função de Segurança Pública e, por isso, não podem exercer a preservação da Ordem Pública. Além disso,
“O cidadão Eduardo passou a ser perseguido e ilegalmente filmado pela Guarda Civil Municipal de Santos e, no dia 18 de julho de 2020, acabou sendo vítima de uma verdadeira armação, pois o guarda municipal que permaneceu na viatura sabia das abordagens anteriores, especialmente a última, quando, pela primeira vez, houve uma altercação”, aponta o texto da defesa. Altercação é o mesmo que discussão inflamada, contenda.
Para explicar as complexidades do caso, o Pleno.News conversou com a advogada Liliane Reis de Queiroz, da OAB-BA.
O caso foi um abuso de autoridade do desembargador?
O abuso de autoridade é um tipo de abuso de poder analisado à luz das normas penais. No caso em apreço do Desembargador, no momento em que ele se recusou a usar a máscara, ele não estava investido do cargo de funcionário público. Logo, ele caminhando na praia era um cidadão particular como outro qualquer que desobedeceu a ordem legal imposta pelo Decreto 8.944/2020 que determina o uso obrigatório das máscaras. Neste ínterim, ele cometeu o crime de desobediência, confirme art. 330 do código Penal.
O que diz a Lei de Abuso de Autoridade?
Vale lembrar que essa legislação foi modificada recentemente e a nova Lei de Abuso de Autoridade vigente passou a valer no dia 3 de janeiro de 2020. Configura-se como autoridade excedida o constrangimento acompanhado por violência ou ameaça, divulgação de gravações sem relação com as provas, prestar falsas informações, antecipação de atribuição de culpa, entre outras violações.
O desembargador rasgou a multa. Ele ficou impune da necessidade de pagar?
Ao rasgar a multa o Desembargador não deverá ficar impune da infração cometida, ele desobedeceu a Lei. Portanto, foi multado e deverá pagá-la, como qualquer outro cidadão que cometer a mesma infração.
A defesa do desembargador alegou que houve abuso de autoridade dos guardas municipais porque eles não podem exercer Segurança Pública. Isso procede?
Já os guardas estavam investidos do cargo público, sendo agentes públicos no exercício de sua função. Nesta senda, no momento em que abordou aquele particular, no caso o Desembargador, os policiais estavam exercendo sua competência dentro de suas atribuições, no caso, impondo ao cidadão obediência ao Decreto 8.944/2020 que obriga o uso de máscaras.
Neste sentido, não há o que se falar de abuso de autoridade em relação aos policiais. Cabe ressaltar que seria abuso de poder se os policiais não cumprissem com sua atribuição em fiscalizar o uso obrigatório das máscaras, pois se não obrigasse não estaria em concordância com a finalidade pública de proteger a sociedade contra o contágio e a proliferação do vírus COVID-19.
E o desembargador não possui direitos especiais?
É de suma importância mencionar que o Desembargador possui sim algumas prerrogativas decorrentes de seu cargo público, conforme a Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Mas, não inclui como prerrogativa o não uso de máscara e nem muito menos desrespeito as autoridades policiais. Dessa forma, essa conduta do Desembargador merece sim ser repudiada, por isso Conselho Nacional de Justiça – CNJ já está analisando esse caso.
O desembargador está sob investigação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O órgão analisa se houve violações da Lei Orgânica da Magistratura e do Código de Ética da Magistratura.
Leia também1 João Doria faz "agrado" de R$ 380 milhões para o TJSP
2 Casal prejudicado por atraso de voo será indenizado em R$ 20 mil
3 Decisão de juíza põe em cheque isenção da Justiça contra negros
4 Justiça suspende investigação contra o ministro Guedes
5 TJ: MP perdeu prazo para recorrer sobre foro de Flavio