Na quarentena, 84 meninas abusadas deram à luz em SP
Crianças de 10 a 14 anos foram vítimas de violência sexual durante isolamento
Pleno.News - 25/08/2020 10h13

Uma estudante de 11 anos de uma escola municipal de Parelheiros, Zona Sul de São Paulo, deu à luz em maio a uma menina após gravidez de risco resultante de estupro denunciado em fase adiantada da gestação.
Em São Paulo, 84 meninas de 10 a 14 anos se tornaram mães em três meses de isolamento social, segundo levantamento da Secretaria Municipal da Saúde.
– Infelizmente, menina grávida de 10 anos não é caso excepcional no Brasil, onde o código penal diz que é estupro de vulnerável relação sexual com menor de 14 anos – afirma Luciana Temer, presidente do Instituto Liberta, que atua na prevenção à violência sexual contra crianças e adolescentes.
A cada hora, quatro meninas de até 13 anos são estupradas no país, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019. O Sistema de Informações Hospitalares do SUS, do Ministério da Saúde, registra por dia, em média, seis abortos de meninas de 10 a 14 anos.
– A sociedade brasileira precisar acordar para a naturalização desses abusos cotidianos – diz a ex-secretária de Assistência Social de SP. Segundo Luciana, são cidadãos “respeitáveis” que praticam violência contra criança, não monstros estereotipados.
ABUSOS DENTRO DE CASA
A exemplo da garota capixaba submetida a um aborto legal em Pernambuco em meio a intenso debate ideológico e religioso, a estudante paulista relatou às autoridades ter engravidado aos 10 anos em um estupro cometido pelo cunhado. Um padrasto também é apontado como abusador em caso detectado pela escola no início do ano letivo.
Em 17 de fevereiro, o Núcleo de Apoio e Acompanhamento para a Aprendizagem (Naapa), da Secretaria Municipal de Educação, foi acionado para dar suporte a uma estudante da sexta série que retornara às aulas em estágio avançado de gestação. O fato já era caso de polícia desde 28 de janeiro, quando foi registrado um boletim de ocorrência.
Dias antes, a menina havia sido levada pela mãe à UBS (Unidade Básica de Saúde) com suspeita de gravidez. A assistência social indagou sobre a possiblidade de a menina ter sofrido abuso. Fato negado pela responsável. Os agentes de saúde notificaram o Conselho Tutelar, acionando o sistema de garantia de direitos, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente, em vigor há mais de três décadas.
Tanto a gravidez a termo da aluna de Parelheiros quanto o aborto legal da garota capixaba mostram em ambos os desfecho as falhas na rede de proteção e na prevenção. As duas entraram pela porta do abuso e da negligência para a estatística de 26 mil adolescentes grávidas por ano no Brasil.
– Precisamos de um sistema que proteja continuamente e não de forma episódica, como agora com esse caso notório quando todo mundo se mobilizou – afirma Márcio Volpi, coordenador do Programa Cidadania dos Adolescentes do Unicef.
*Folhapress/Eliane Trindade
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