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Quem são os bravos heróis da tragédia de Brumadinho?

Sem medir esforços, eles abrem mão do conforto e do próprio bem-estar para levar esperança aos moradores da cidade

Rafael Ramos - 25/02/2019 07h10

Trinta dias já se passaram desde o rompimento da barragem em Córrego do Feijão, na cidade mineira de Brumadinho. Além da lama, a tragédia mudou completamente a rotina da população. Entretanto, ao mesmo tempo que lida com o luto e o pesadelo de não poder enterrar algum parente, os brumadinhenses contam com a ajuda de pessoas que são verdadeiros heróis sem capa.

Porta-voz do Corpo de Bombeiros de Brumadinho, o tenente Pedro Aihara, de 25 anos, tem lutado incansavelmente para manter a população avisada sobre os trabalhos dos mais de 100 homens envolvidos nas buscas. Pedro lembra que, na hora da tragédia, ele estava em sua sessão de trabalho quando todos foram avisados da quebra da barragem. O tenente só teve dimensão da tragédia quando sobrevoou o local.

– Quando sobrevoei a área, vi que nosso trabalho ia demandar muito tempo. Foi um sentimento de preocupação muito grande para dar início a todas as medidas que pudessem atender as primeiras respostas daquelas ações de salvamento. Meu primeiro dia foi uma correria gigantesca porque estava sendo demandado pela imprensa, pelos familiares e pela própria ação. Era grande a necessidade de estar forte para ajudar aquelas pessoas, a minha equipe e dar o meu máximo – contou Pedro ao Pleno.News.

Pedro Aihara é o porta-voz dos bombeiros de Brumadinho Foto: Divulgação

Tamanha foi a surpresa com tudo o que aconteceu que Pedro praticamente não conseguia se alimentar nem dormir nos primeiros seis dias. Só a partir do 20º dia de trabalho que ele conseguiu melhorar as horas de sono.

– Operações que envolvem rejeitos de lama são muito difíceis. Mas o mais difícil é ter que lidar com a dor de tantas famílias. A gente sabe a importância do nosso trabalho e, quanto mais a gente trabalha, mais sofrimento a gente consegue tirar dos sobreviventes. A gente escolheu ser bombeiro e colocamos o interesse e a vida dos outros acima da nossa. O bombeiro nunca pode perder a esperança, mesmo que seja só para recuperar um corpo. Se isso trouxer um pouco de alívio, a nossa atuação não vai ser em vão.

APOIO VOLUNTÁRIO
Parte dessa esperança tem sido mantida graças ao trabalho de voluntários que vieram de diversas partes do país rumo a Brumadinho. Uma dessas pessoas é a missionária Doroti Campos, filiada à Convenção Batista Mineira. Há quatro anos, ela presenciou o sofrimento da população de Barra Longa, devido ao rompimento da barragem de Mariana. Hoje, ela se divide entre coordenar cada ação e os cuidados da saúde debilitada devido à contaminação por metais presentes na lama e na poeira de Barra Longa.

Doroti e os demais voluntários fizeram sua base na Primeira Igreja Batista de Brumadinho, onde funciona uma lavanderia responsável por cuidar das roupas e uniformes dos bombeiros. Ela chegou em Brumadinho um dia após o rompimento da barragem e sua rotina inclui acordar bem cedo para às seis da manhã estar na base militar montada pelos bombeiros no Córrego do Feijão. Lá são recolhidas as roupas sujas de lama dos bombeiros e levadas para a lavanderia onde o trabalho não para. Às 17h, a equipe retorna à base militar para devolver as roupas limpas e pegar mais.

Doroti Campos é missionária pela Convenção Batista Mineira Foto: Pleno.News

Na lavanderia, todos os voluntários são obrigados a trajar roupas adequadas para evitar contaminação seja dos minérios ou a contaminação cadavérica. Máscaras, óculos, macacões, toucas, aventais, botas e luvas especiais até o cotovelo compõe o uniforme da equipe. Além da lavanderia, eles também montaram um Correio da Esperança, onde entregam cartas endereçadas aos bombeiros com desenhos e mensagens de crianças de todo país. Os voluntários, conhecidos como coletes amarelos devido à cor do uniforme, também realizam visitas aos familiares das vítimas desparecidas, acompanham velórios e distribuem alimentos, dentre outras tarefas.

Para Doroti, a oportunidade de poder levar um pouco de alento à população atingida não tem preço. Além de ter que lidar com o drama das pessoas, a missionária batista também precisa lidar com os efeitos da contaminação sofrida pelos metais de Mariana. Ela faz acompanhamento médico e tem uma alimentação balanceada, mas afirma que se sentir útil às pessoas é gratificante.

– Não importa quantos morreram, vidas são vidas, mas parece que o ser humano precisa de tragédia. A identidade cultural de Brumadinho e Barra Longa se perdeu e não tem dinheiro que traga de volta. Enquanto a justiça não é feita, a gente olha para aquele que está ao lado e estende a mão para ajudar. A gente trabalha com os princípios de Deus e Deus é comunidade. É olhar além das nossas necessidades.

“CHORAI COM OS QUE CHORAM”
Quem também tem se desprendido para ajudar as famílias de Brumadinho é o pastor Isidro Neto. Membro da Primeira Igreja Batista em Sertãozinho, no interior de São Paulo, Isidro já atendeu cerca de 2 mil estudantes levando palestras motivacionais nas escolas da cidade. Quando ouviu sobre a tragédia e o sofrimento das famílias, ele sentiu que não poderia deixar de estender um pouco de carinho a esse povo.

– Além de palestras nas escolas, tenho visitado lares, acompanho velórios, sinto de perto a dor de todos. Não apenas dando ombro para que chorem, mas chorando junto. Não tem como não se sensibilizar diante da preocupação com as pessoas. Vim mostrar que eles não estão sós, não estão abandonados e não foram esquecidos.

Pr. Isidro Neto saiu do interior de São Paulo para ser voluntário em Brumadinho Foto: Arquivo Pessoal

A rotina de Isidro começa por volta das sete da manhã. Após tomar café, ele tira um tempo de oração pelas famílias e pelos alunos. Às 9h, ele se dirige para dar uma palavra nas escolas antes dos alunos entrarem para a sala de aula. Em alguns dias, nem há tempo para o café. O mais importante é motivar os que ficaram.

– Vivemos dias em que as pessoas não se valorizam, mas Deus nos valoriza tanto que deu o Seu Filho por nós. Nossa recompensa é o bem-estar das pessoas. Saber que podemos reerguer pessoas e aumentar a fé nelas mesmas e em Deus, que pode fazer infinitamente mais – afirma pastor Isidro, que retorna para casa nesta semana.

“MEU LUGAR É AQUI”
Assim como Isidro, pensar no bem-estar do próximo foi o que fez de Dari Pereira um verdadeiro salvador para a família e os vizinhos. Morador do Córrego do Feijão, onde ficava a barragem, ele ouviu o barulho do estouro da barragem a tempo de salvar a família e ajudar alguns vizinhos. Tentando recomeçar a vida, ele tem recebido doações da Vale, mas ainda consegue repassar parte dos donativos.

– Estava em casa quando a lama chegou. Foi o tempo de tirar o pessoal de dentro de casa e pegar uma menininha de 3 anos que estava numa casa próximo. As casas foram arrancadas do chão e os carros foram embora. Quando eu olhei para trás já vi a lama chegando. A gente peleja a vida toda pra construir e em questão de segundos vimos tudo ir embora. É difícil falar sobre isso, mas o meu lugar é aqui.

Dari (de amarelo) conseguiu tirar a família de casa na hora da tragédia Foto: Pleno.News

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