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Estudante de 14 anos era de família religiosa

Gabriela Doria - 19/05/2020 19h49 | atualizado em 19/05/2020 19h59

João Pedro Matos Pinto, de 14 anos, foi morto em casa durante ação policial Foto: Reprodução

Um adolescente de 14 anos foi baleado nesta segunda-feira (18) dentro da casa de seu tio em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, durante uma operação da Polícia Federal com apoio das polícias Civil e Militar fluminenses.

Parentes e amigos dizem que João Pedro Matos Pinto brincava com os primos quando os agentes invadiram o imóvel e atiraram em sua barriga. Já as polícias alegam que o adolescente foi atingido durante um confronto com bandidos que pularam o muro da casa.

O garoto foi socorrido de helicóptero. Sem informações, a família começou uma busca por toda a madrugada em hospitais e IMLs (Institutos Médico-Legais) e criou uma campanha nas redes sociais com a #procurasejoaopedro. Só encontraram seu corpo na manhã desta terça (19), no IML da cidade.

– Quero dizer, senhor governador, que a sua polícia não matou só um jovem de 14 anos com um sonho e projetos, a sua polícia matou uma família completa, matou um pai, matou uma mãe, e o João Pedro – lamentou Neilton Pinto, pai do menino.

De família religiosa, João Pedro frequentava a igreja e planejava o futuro.

– Um jovem com um futuro brilhante pela frente, que já sabia o que queria do seu futuro. Mas, infelizmente, a polícia interrompeu o sonho do meu filho. A polícia chegou lá de uma maneira cruel, atirando, jogando granada, sem perguntar quem era. Se eles conhecessem a índole do meu filho, quem era meu filho, não faziam isso. Meu filho é um estudante, um servo de Deus. A vida dele era casa, igreja, escola e jogo no celular – desabafou Neilton.

TESTEMUNHAS DENUNCIAM AÇÃO POLICIAL
Um perfil virtual criado pela família divulgou o relato em áudio de um dos primos que estavam com João Pedro no momento da ocorrência, também adolescente.

– A gente tava jogando sinuca, e o helicóptero começou a voar envolta da casa. Aí começaram a dar tiro em direção ao morro. A gente entrou dentro de casa e ficou lá. Aí todo mundo deitou no chão. O primo de D* viu, o M* viu, os policiais entrando, se agachando ali no deque da piscina – conta.

Ele continuou o relato.

– Aí a gente foi, deitou no chão, levantou a mão, o M* começou a gritar que só tinha criança. [pausa] Aí eles tacaram duas granadas assim na porta da sala. Quem tava mais perto da porta era eu e o João. Aí ficou um zumbido, eles deram muitos tiros na janela e a gente saiu correndo para o quarto – continua.

A testemunha passa a acusar os policiais.

– Nisso que a gente correu para o quarto ficou o João e D* na sala, na copa, deitada. Os policiais entraram, mandaram a gente deitar no chão e todo mundo calar a boca. Eu olhei para a frente e o João tava deitado, mas eu não sabia o que tinha acontecido, para mim ele tava só… O policial viu a pulsação dele para ver se ele tava vivo – diz.

O primo segue o relato.

– O M e o amigo dele pegaram ele [João], botaram no carro, e nisso que o M tava levando ele para o carro, a gente escutou o M gritando e uns tiros. As polícias deram tiro no M enquanto ele levava o João para o carro, para o helicóptero pegar ele – conclui o primo.

À reportagem, uma tia afirmou que, na manhã desta terça, a família ainda não sabia onde o menino morreu.

– O primo passou na casa dele e foi lá buscá-lo para brincar. Eles estavam no quintal da casa. Ele se assustou com o policial, e o policial atirou na barriga dele. Até agora não sabemos de nada. Se ele morreu no local, a caminho do hospital – disse Georgia Matos de Assis.

João Pedro era filho de uma professora e de um comerciante e vinha de uma família religiosa.

– A família está imobilizada, estamos acabados. Ele era um menino muito bom, era estudante de um colégio particular. A mãe dele é professora, família da igreja – contou.

Uma amiga relatou que parentes foram impedidos por policiais de embarcar no helicóptero.

– Obrigaram a socorrê-lo até um campo de futebol, onde o helicóptero fez o resgate, mas impediram que os familiares embarcassem junto com ele – disse Érika de Souza.

POLICIAIS FALAM EM CONFRONTO
A superintendência da Polícia Federal no Rio divulgou uma nota na manhã desta terça confirmando que um adolescente foi ferido durante uma operação no Complexo do Salgueiro com apoio da Core (Coordenadoria de Recursos Especiais) da Polícia Civil.

Segundo o órgão, a ação tinha como objetivo cumprir dois mandados de busca e apreensão contra lideranças de uma facção criminosa da região. Diferentemente do primo de João Pedro, a corporação afirma que quem jogou as granadas foram bandidos que pularam o muro da casa.

– Durante a ação, seguranças dos traficantes tentaram fugir pulando o muro de uma casa. Eles dispararam contra os policiais e arremessaram granadas na direção dos agentes – diz o comunicado. No local foram apreendidas granadas e uma pistola.

Tanto a PF quanto a Polícia Civil informaram que o jovem ferido foi socorrido de helicóptero e que médicos do Corpo de Bombeiros prestaram atendimento, mas ele não resistiu aos ferimentos. O corpo então foi encaminhado ao IML de São Gonçalo.

A delegacia de homicídios de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí instaurou um inquérito para apurar a morte de João Pedro, e a Polícia Federal disse que “acompanhará e prestará todas as informações e apoio necessário à elucidação dos fatos”.

– Foi realizada uma perícia no local e duas testemunhas prestaram depoimento na delegacia. Os policiais foram ouvidos e as armas apreendidas para confronto balístico. Outras diligências estão sendo realizadas para esclarecer as circunstâncias do fato – declarou a Polícia Civil.

Já a Polícia Militar afirmou que o Batalhão Aeromóvel (GAM) atuou em apoio aéreo à operação, mas que o grupamento não foi solicitado para socorrer pessoas feridas durante a ação.

Comunidade foi alvo de nova operação nesta terça Nesta terça, na manhã seguinte à morte de João Pedro, a Polícia Federal e a Polícia Militar voltaram ao Complexo do Salgueiro para novas operações, e moradores relataram mais confrontos e dois helicópteros sobrevoando o local.

A PF diz que a ação tinha como objetivo apurar denúncias de que traficantes estariam utilizando uma casa no alto da mata da comunidade como apoio.

– Os policiais localizaram esse ponto estratégico que permitia aos suspeitos visão privilegiada da região, inclusive com monitoramento de ações policiais e rota de fuga para os suspeitos – afirma em nota.

Segundo a corporação, foram apreendidas armas, drogas, munições, carregadores, roupas camufladas, entre outros materiais, que foram levados à superintendência e serão objeto de investigações futuras.

Já a PM informou apenas que “policiais militares do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) atuam na Comunidade do Salgueiro” e que, até o início da tarde, não havia informações de prisões ou apreensões.

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