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Especialista explica: Por que os prédios caíram?

Luiz Eduardo Aguiar é coordenador dos Cursos de Pós-Graduação em Engenharia Estrutural e em Engenharia Legal da UNISUAM, atua como Conselheiro Suplente do CREA/RJ e fala sobre os riscos de desabamento

Virgínia Martin - 12/04/2019 18h30 | atualizado em 15/04/2019 10h56

Tudo isso pode ser visto como aparente crime ambiental, observa Luiz Aguiar

Depois que dois prédios desabaram na Muzema, comunidade localizada no bairro do Itanhangá, Zona Oeste do Rio de Janeiro, um processo de gerenciamento de crise se instalou. O episódio aconteceu na manhã desta sexta-feira (12), quando uma construção de quatro andares e outra de três desabaram. O resgate de vítimas continua e até agora 10 pessoas (8 feridos e 2 mortos) foram encontradas.

Segundo a Prefeitura do Rio de Janeiro, os imóveis são ilegais. Por isso, mandou interditar, no ano passado, os dois prédios. Mas, diz o prefeito Marcelo Crivella, que uma liminar impediu que os imóveis fossem demolidos. Entre uma e outra força política e alertas das análises de engenharia, o grande estrago foi feito.

Em 2016, a Secretaria Municipal de Ordem Pública (Seop) demoliu dois edifícios que estavam sendo erguidos de forma irregular, exatamente na Estrada do Itanhangá. De acordo com a prefeitura, cada unidade tinha cerca de 23 apartamentos, dos quais dois estavam ocupados, todos instalados ilegalmente naquela região. Daquela vez, uma tragédia foi evitada.

Pleno.News convidou um especialista na área de Engenharia Civil para explicar quais são os fatores e critérios que definem quando uma obra é ou não segura para ser habitada. Luiz Eduardo Aguiar é coordenador dos Cursos de Pós Graduação em Engenharia Estrutural e em Engenharia Legal da UNISUAM. Atua também como Conselheiro Suplente do CREA – RJ e é mestre em Engenharia Civil.

O que a engenharia estrutural exige como condição básica e determinante para que uma edificação seja concluída e aprovada para moradia?

Inicialmente, a engenharia estrutural fica ligada aos projetos e à legalização da obra. Principalmente a entrada dessa documentação junto à prefeitura, com posterior alvará. A partir daí, você tem a execução dos projetos, que foram planejados e calculados para fins de execução. É sempre dentro dessa perspectiva que uma obra é legalizada e executada. Dentro dos projetos, são obedecidos os fatores de risco. As próprias normas técnicas devem ser atendidas, e o profissional, o responsável técnico que faz esse acompanhamento desde o projeto até a execução, fica vinculado a essas questões técnicas.

Quais os maiores fatores da engenharia que garantem segurança para prédios urbanos?

Existem normas técnicas. Existe a legislação do município do Rio e também no âmbito do Estado, com as padronizações, os gabaritos, para que os profissionais possam construir conforme as determinações. Existe todo um arcabouço legal que deve ser obedecido. Os profissionais, sejam arquitetos ou engenheiros estruturais, vão pensar sobre a viabilidade de determinada construção. Os cálculos são feitos, observando normas, desde a parte de fundação até a estrutura em si da edificação.

Quais os fatores de risco que são alerta dentro da Engenharia Civil?

Existe uma análise de fatores de risco, principalmente quando se inicia o projeto da edificação. Análise de cargas, de esforços sobre a estrutura projetada. Podemos ver a parte de excesso e visualizar fissuras, trincas, rachaduras, que são chamadas de respostas. A partir dali, é preciso fazer um monitoramento. Se essa edificação já tem certa idade, os moradores ou até mesmo o síndico do condomínio é responsável por isso.

É bom ressaltar que existe a autovistoria. A cada cinco anos, os prédios precisam passar por um processo de autovistoria. Profissionais qualificados e treinados na área de engenharia legal fazem essa análise e dão essa resposta para o síndico, para que ele e o condomínio possam tomar as medidas necessárias para correção. Estas são chamadas de medidas preventivas e corretivas para que não ocorra qualquer tipo de colapsamento, seja nas instalações ou até mesmo na parte estrutural. Recentemente, vimos problemas em fachadas de edifícios. Elas estavam caindo sobre as calçadas. Tudo isso pode ser detectado em um laudo de constatação, que faz parte de um grau de importância de inspeção.

Em casos como este de Itanhangá, o que pode ser feito para evitar uma tragédia de desabamento?

Neste caso específico do Itanhangá, há ali processos de construções irregulares. É possível verificar que há ausência da legalização dos projetos de construção. A Prefeitura, inclusive, não deu o alvará da obra, não permitiu aquelas construções. Depois de construídos, os prédios ficaram de pé mediante liminares judiciais. O ideal é que, nessas situações, todas as pessoas que pretendem adquirir este imóvel verifiquem se as suas documentações são fidedignas, se são legais, se estão realmente registradas. Precisam checar a questão do próprio RGI, a parte de desmembramento das unidades. Só depois disso aprovado é que devem desfrutar da propriedade. É importante que os moradores, os adquirentes, possam verificar essa situação. Ali nos prédios do Itanhangá, as pessoas adquiriram imóveis por um preço muito barato, provavelmente pensando na oportunidade de morar próximo ao local de trabalho. E assim correm o risco de passar por situações de risco e morte.

Especificamente, o que pode ter ocorrido?

Eu posso dar um prognóstico dentro das análises que eu fiz das imagens do local. Ali, possivelmente, houve um problema de solo, de umidade. O solo não resistiu à carga e a estrutura veio a colapsar por conta dessa ausência de resistência do solo, por conta da umidade. Aquela é uma área muito verde, de mata, então, provavelmente, teve uma fragilidade do solo. A parte de trás da edificação fica em uma área verde, e, possivelmente, pela percolação dessa água naquele ponto, fragilizou o solo, a parte de trás cedeu, desestabilizou a estrutura, e ela veio a colapso.

Se você for analisar as imagens, você pode ver que o prédio teve uma pequena inclinação para trás quando ele veio abaixo. Na verdade, não foi um sistema como se fosse uma demolição tipo sanduíche. Possivelmente, houve ausência da resistência do solo nessa parte de trás do prédio que o levou a tombar e, consequentemente, fez tombar o outro.

Quais questões técnicas precisam ser seguidas?

Sobre as questões técnicas, a gente pode falar sobre a parte de legislação, das próprias normas técnicas. Temos a NBR 6118, uma norma que foi atualizada recentemente. Ela é de 2014 e trata sobre as construções e os projetos de concreto armado. A Norma 8800, que fala sobre a parte de fundação. São normas relativas à construção civil, à parte construtiva, de projetos e de execução. Obviamente, tem que atender aos padrões construtivos. São disciplinas da engenharia civil que devem ser atendidas. E podemos entrar no âmbito de legislação da prefeitura, na questão de padronização, gabarito, espaçamentos, que precisam ser observados. Para cada região, as chamadas zonas, é preciso uma padronização. Tudo é visto pela Secretaria de Habitação do Rio de Janeiro.

Os prédios do Itanhangá foram construídos em locais inadequados.

As construções ali no Itanhangá, pelo que está sendo relatado, pelas próprias imagens que vemos, percebemos que trata-se de um lugar inadequado. Ali, com certeza, as ruas não têm um sistema de drenagem adequado, o que prejudica o próprio escoamento de águas pluviais. Ou seja, as águas das chuvas entram no solo e, dependendo de onde a água entra, ela vai ter algum ponto de escoamento. E pode esbarrar em alguma construção, ou seja, na parte de baixo da construção. A água acabou fragilizando a construção. E aquela é uma área de mata, de proteção ambiental. Tudo isso pode ser visto como aparente crime ambiental.

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