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Decisão de juíza põe em cheque isenção da Justiça contra negros

Magistrada afirmou que acusado era integrante de grupo criminoso "em razão da sua raça"

Pleno.News - 17/08/2020 14h09 | atualizado em 17/08/2020 15h04

Juíza Inês Marchalek Zarpelon é acusada por sentença ter se baseado em raça do acusado Foto: Prefeitura de campo Largo/Marcos S. Neto

A decisão da juíza Inês Marchalek Zarpelon, que relacionou a participação de um homem em um grupo criminoso com a raça dele, repercutiu negativamente no meio judiciário nesta semana. Trata-se de Natan Vieira da Paz, de 42 anos, que foi condenado a 14 anos e dois meses de prisão por organização criminosa e roubos em Curitiba, Paraná.

A magistrada chegou a ir a público se desculpar e afirmou que a frase que gerou críticas foi tirada de um contexto maior.

– Peço sinceras desculpas se, de alguma forma, em razão da interpretação do trecho específico da sentença, ofendi a alguém. Sinto-me profundamente entristecida se fiz chegar, de forma inadequada, uma mensagem à sociedade que não condiz com os valores que todos nós devemos defender – escreveu.

O Pleno.News conversou com duas advogadas sobre o caso. A advogada familiarista e criminalista Lilian Souza Santos, do Espírito Santo, argumenta sobre o porquê de a decisão ter sido racista.

– Trata-se de um caso repugnante, onde nos deparamos com uma sentença dotada da ausência de neutralidade da magistrada, explícita em sua atividade judicante. Através deste julgamento, ao qual condenou o réu negro, vemos notadamente que a consciência da juíza não é um ponto cego ou isolado da cultura social atual. E, ao prolatar esta sentença, a magistrada adotou uma conduta influenciada tanto por fatores externos, quanto internos. Todavia, no ponto de vista jurídico, caberá, a depender da decisão (voto) dos Desembargadores do Tribunal de Justiça do Paraná que tal sentença condenatória seja reformada ou até mesmo anulada, retornando o processo ao ato e/ou estágio anterior à condenação. Vale ressaltar que, não é de praxe sentenças condenatórias ou não, que façam menção direta à raça, tornando a termo tal manifestação racista e discriminatória do magistrado. O fato é que a “raça” não é requisito condenatório e existem inúmeros argumentos para se “condenar um negro” sem a necessidade de dizer que é pela raça. – declarou ao Pleno.News.

A consciência da juíza não é um ponto cego ou isolado da cultura social atual

Ao ser perguntada se é possível dizer que a Justiça brasileira é movida pelo racismo contra negros, a advogada recrimina generalizações.

– Dizer que a Justiça brasileira é racista é uma generalização descabida e talvez um certo “exagero”. Todavia, muitos operadores do sistema jurídico-judiciário e da Justiça brasileira, bem como uma parcela considerável da sociedade atual, em pleno século 21, são, lamentavelmente, preconceituosos e racistas sim – ponderou.

Advogada Lilian Souza, do Espírito Santo Foto: Reprodução

Já segundo a advogada Liliane Meire Reis de Queiroz, de Salvador, Bahia, faltou ser colocado em prática o princípio da Impessoalidade.

O caso da juíza do Paraná repercutiu negativamente como um ato racista. É possível que uma afirmação daquela entre numa sentença?
Infelizmente, não é só possível como é recorrente afirmações como aquelas presentes nas sentenças, o que é indevido e merece ser repudiado pelo Judiciário. Para tanto, é preciso escandalizar esse tipo de sentença para que o Conselho Nacional de Justiça – CNJ , possa combater a prática dessa conduta nas decisões através de abertura de investigação da conduta do magistrado, como está sendo realizado no caso em apreço.

As decisões do judiciário são subjetivas? É possível que um juiz tire conclusões a partir da raça do acusado?
Muitas decisões são subjetivas, infelizmente, daí se faz a importância do advogado para combater essas decisões subjetivas e utilizar dos recursos processuais em busca de não penalizar ainda mais o réu em julgamento por conta de sua raça.

Ainda nesse sentido, é possível e é o que acontece, lamentavelmente, o juiz decide através de suas conclusões pessoais, majorando a pena a partir da raça do acusado.

Infelizmente, o magistrado esquece que está investido no cargo para representar o Estado, logo, não está ali para julgar de acordo com seu juízo de valor. Existe o princípio da Impessoalidade que deve reger as decisões. Sendo o magistrado impessoal, não deve olhar a raça do acusado para julgá-lo.


Advogada Liliane Queiroz, de Salvador

Sendo o magistrado impessoal não deve olhar a raça do acusado para julgá-lo

A juíza afirmou que foi mal interpretada e que a frase foi tirada de contexto. Essa possibilidade de má interpretação não é uma falha do sistema?
Com certeza, é uma falha no sistema, o que justifica o maior número de negros nas unidades carcerária, e um racismo exacerbado do judiciário que precisa com urgência ser combatido. Um acusado jamais pode ter a dosimetria de sua pena maior, simplesmente por ser negro. Sua raça jamais pode ser usada para julgar sua conduta na sociedade.

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