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Sambas-enredo de 2020 trarão críticas a Bolsonaro e uma visão polêmica sobre Jesus

Rafael Ramos - 18/12/2019 18h17 | atualizado em 18/12/2019 18h18

Mangueira usará a figura de Jesus para criticar o cenário político Foto: Reprodução

A dois meses para o Carnaval 2020, as escolas de samba do Rio de Janeiro já estão a todo o vapor para o desfile na Marquês de Sapucaí. Lançado no início de dezembro, o CD com os sambas-enredo das agremiações mostra que a festa do Momo será marcada por críticas ao presidente Jair Bolsonaro e interpretações pouco convencionais sobre Jesus e a fé cristã.

Se a folia deste ano, em São Paulo, foi marcada por uma representação polêmica de Jesus sendo vencido pelo diabo no desfile da Gaviões da Fiel, que rendeu até um processo contra a escola por desrespeito à fé cristã, a Acadêmicos da Grande Rio promete colocar lenha na fogueira das discussões no ano que vem. A agremiação de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, vai abordar a intolerância religiosa com o enredo “Tata Londirá: O Canto do Caboclo no Quilombo de Caxias”.

Desfile da Gaviões da Fiel mostrou Jesus sendo vencido por Satanás Foto: Reprodução

A Verde-e-Vermelho vai mostrar “o legado de um líder negro, homossexual e nordestino, bailarino que ousou dançar com o poder instituído e enfrentou, de queixo alto e voz potente, as navalhas do preconceito”. Um trecho do samba-enredo inclusive diz “Salve o candomblé, eparrei oyá / Grande Rio é tata londirá / Pelo amor de Deus, pelo amor que há na fé / Eu respeito seu amém / Você respeita meu axé”.

O especialista em carnaval, José Maurício Conrado da Silva, que também é professor de marketing da Universidade Presbiteriana Mackenzie, explica que enredo do próximo ano começa a ser pensado pela diretoria da escola de samba assim que se termina um carnaval.

– Considerando os aspectos econômicos da sociedade atual, o carnaval se distanciou um pouco das camadas mais populares por ter ser tornado uma festa cara e mais exclusiva. Porém, como qualquer manifestação popular, ele passa por diferentes níveis de aceitação. É claro que as pessoas que participam da religião católica, por exemplo, não verão com bons olhos a manifestação, uma vez que a festa pode ir contra alguns preceitos desta religião em particular. No entanto, há diferentes perspectivas e locais de fala na sociedade. Deve-se considerar a heterogeneidade da sociedade para se pensar a presença e sucesso ou não de uma festa como o carnaval – disse José Maurício ao Pleno.News.

Leandro Vieira pretende mandar um recado a Jair Bolsonaro no desfile da Mangueira Foto: Reprodução

Campeã do Carnaval carioca deste ano, a Mangueira também vai falar sobre Jesus na Sapucaí com o enredo “A Verdade Vos Fará Livre”. Fazendo alusão ao versículo bíblico de João 8:32, que virou praticamente um lema do governo de Jair Bolsonaro, o samba-enredo será uma crítica direta ao avanço do conservadorismo no Brasil.

De acordo com o carnavalesco Leandro Veira, a Verde-e-Rosa vai falar sobre a figura política de Cristo e o amor irrestrito que Ele pregava. Assim como a Grande Rio, ele também pretende tocar na questão da intolerância religiosa.

– Não é amor o que faz alguém quebrar um terreiro de candomblé. Quando Cristo esteve aqui, ficou do lado dos oprimidos e não fez distinção de pessoas. Será que Jesus não está no morador da favela? No menor abandonado? No gay? Na mãe de santo? É um recado político para o presidente Bolsonaro – disse Leandro em entrevista ao jornal O Globo na época em o samba-enredo foi divulgado.

Marcelo Adnet virá fantasiado de Jair Bolsonaro no desfile da São Clemente Foto: Reprodução

Fazendo coro com a Mangueira, a São Clemente trará o humorista Marcelo Adnet interpretando o presidente da República. Um dos autores do enredo “O Conto do Vigário”, Adnet cutuca a situação política do país em versos como “Brasil compartilhou, viralizou, nem viu / E o país inteiro assim sambou, caiu na fake news”.

Usar de figuras públicas em seus enredos não é algo novo. Entretanto, o professor José Maurício Conrado da Silva afirma que o Carnaval não deve ser visto como único meio de protesto e nem como portador de verdades absolutas.

– O uso de figuras políticas no Carnaval é bastante comum no carnaval por ter raízes na Idade Média. Sempre foi visto como uma festa da inversão de valores, onde figuras como reis eram satirizados. A sátira é algo importante para a expressão popular. Por isto, a sátira e caricatura típica do carnaval não devem ser vistas como ataque pessoal, mas como parte da expressão popular.

O professor José Maurício Conrado da Silva afirma que o Carnaval não deve ser visto como único meio de protesto e nem como portador de verdades absolutas

O pastor e linguista Luiz Sayão ressalta que tais manifestações artísticas possuem dois lados: um inocente e ingênuo e outro que permite trabalhar conceitos de forma poderosa na sociedade. Entretanto, ele alerta que a arte popular, como o carnaval brasileiro, precisa ser acima de tudo responsável.

– Essa atitude construtiva passa por uma crítica necessária para nos levar a observar todos os aspectos impertinentes a nossa realidade. Por outro lado, é importante que essa arte tenha uma pauta pró-ativa para, de fato, tentar sugerir elementos favoráveis e positivos para a construção de uma sociedade melhor. Quando a arte passa a ser uma instrumentalização de uma determinada ideologia, ela apenas manipula uma situação para construir um determinado discurso estético e, a partir dessa construção, atingir objetivos que não são necessariamente construtivos para a nossa sociedade. Portanto, é necessário tato, atenção e equilíbrio para que o melhor aconteça para benefício do nosso povo e do nosso Brasil – declarou ao Pleno.News.

Em 2018, a Paraíso do Tuiuti levou um vampiro para a avenida em alusão a Michel Temer Foto: Reprodução

Da mesma forma, a psicóloga Marisa Lobo acredita que o Carnaval nunca foi uma festa ingênua e que os desfiles sempre tiveram um cunho militante. Ela classifica a folia como um evento de manipulação de massa, ideológica e política. Diante do que já foi divulgado sobre os enredos para 2020, ela crê que o ano será muito pior e favorável aos manipuladores na conquista de seus objetivos.

– Há muito tempo o Carnaval deixou de ser uma festa apenas pagã de cunho religioso para se tornar um evento usado para alienar seus admiradores e promover promiscuidade, travestido de festa turística e cultural. O foco exclusivo é o ativismo contra valores e agora contra governos que não apoiam suas causas. Este ano, será usado como uma engenharia social para doutrinar e desconstruir não somente a fé, mas promoverá fakes contra o governo do Bolsonaro. Tudo o que conhecemos como arte está sendo usado para manipular o mundo com informações falsas. Já deixou de ser festa para virar lacração subversiva e esquerdopata.

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