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CPI da Pandemia podia fazer história, mas escolheu virar palanque

O relator atua como se o único objetivo da comissão fosse atacar o governo

Eduardo Girão - 18/06/2021 17h22

Senadores integrantes da CPI conversam com a imprensa sobre as ações da comissão Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

Após quase dois meses de atividade, a CPI da Pandemia confirma as baixas expectativas que tínhamos quando ela foi instalada. Embora seja fruto de dois requerimentos, um deles de minha autoria, o relator da CPI, pai de um governador que devia ser investigado pela comissão, atua até agora como se o único objetivo da existência da comissão fosse atacar o governo, ignorando todos os indícios, descobertos pela Polícia Federal, de que houve desvio de recursos enviados pela União para estados e municípios, a fim de auxiliar no tratamento dos pacientes com coronavírus.

Um dos pedidos de convocação recentemente rejeitados pelo grupo que comanda a comissão diz respeito ao escândalo do Consórcio Nordeste, que inclui o Ceará, e que está relacionado à compra de 300 respiradores provenientes da indústria da maconha e que jamais foram entregues, provocando prejuízo estimado em R$ 48,7 milhões. O fato consta em relatório da Polícia Federal e há ampla documentação a respeito, devidamente entregue à imprensa. Mesmo assim, o esforço de alguns colegas para que esse assunto seja deixado de lado é espantoso.

Em mais de uma ocasião, eu propus um revezamento na convocação de depoentes, de modo que fossem chamadas tanto autoridades do governo federal, como aquelas provenientes de estados e municípios, relacionadas à recepção e administração de recursos destinados ao enfrentamento da pandemia, principalmente seus principais mandatários, ou seja, governadores e prefeitos. Essa sugestão também foi rejeitada pela comissão.

Governador Wilson Witzel deixou CPI usando o habeas corpus Foto: Agência Senado/Jefferson Rudy

Na história das CPIs, encontramos comissões honrosas, que cumpriram com coragem e competência seu papel de combate à corrupção, como a CPI dos Correios, em 2005, que resultou na revelação do escândalo do mensalão, desmontando um esquema criminoso de compra de apoio político e uso indevido do dinheiro público. Infelizmente, aquela iniciativa bem-sucedida não é usada agora como exemplo.

Além dos constrangedores sinais de que a atual CPI não quer olhar para os indícios de corrupção, ela esbanja evidências de que seu foco é mesmo o de tornar-se palanque político para 2022. Exemplo disso é o tratamento explicitamente diferenciado que o relator dá aos depoentes. Aqueles dispostos a atacar o presidente são tratados com compreensão e cortesia; aqueles que defendem as ações tomadas pelo governo são alvos de atos de intimidação e de demonstrações de grosseria.

Foi o que houve, por exemplo, com a Dra. Nise Yamaguchi, médica oncologista e imunologista, que já atendeu a mais de dez mil pacientes, em seus 40 anos salvando vidas. A contribuição pública e voluntária dela com governo lhe rendeu contínuas interrupções em seu depoimento na CPI, de modo que ela diversas vezes foi impedida de completar suas explicações, sendo notoriamente induzida a responder conforme a vontade do relator e submetida a covarde humilhação.

Médica Nise Yamaguchi na CPI da Covid Foto: Agência Senado/Edilson Rodrigues

É claro que o comportamento de Bolsonaro é passível de críticas. Considero inoportunas as frequentes ocasiões em que o chefe da nação não dá exemplo, ao provocar aglomerações, não usar máscara e fazer uso político de medicamentos. Contudo, isso não justifica a agressão generalizada contra seus colaboradores nem o ato de fechar os olhos para os erros cometidos por outras instâncias do Executivo. Essa seletividade é um grave desrespeito ao povo que poderia ter recebido tratamento apropriado nas estruturas de Saúde locais, mas isso não aconteceu, pois o dinheiro foi usado para outros fins.

Em muitos lugares do mundo, o momento de crise global foi transformado em oportunidade de união, de solidariedade, para todos atravessarem juntos as dificuldades e chegarem ao fim dessa dura jornada.

Infelizmente, não é o que vemos no Brasil. A polarização excessiva tem agravado nossos problemas, inflamado ataques desnecessários e alimentado injustiças.

A CPI poderia ter um papel importante na superação dessa tendência, ser um instrumento de pacificação do nosso país. Mas, em vez disso, ela parece ter escolhido ser um trampolim para os cargos a serem disputados no ano que vem.

Eduardo Girão é senador da República pelo Podemos/Ceará. Atua em defesa da ética, pelo serviço ao próximo e a honestidade como guias para a construção de uma cultura de paz.
* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.

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