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A perseguição religiosa dos dias de Villegaignon à era das redes sociais

Nas últimas semanas as redes sociais foram inundadas por textos preconceituosos

Renato Vargens - 19/11/2019 13h13

As primeiras informações que retratam de forma efetiva a perseguição religiosa no Brasil remete ao ano de 1557, quando os huguenotes (calvinistas franceses) chegaram ao Rio de Janeiro com o propósito de ajudar a estabelecer um refúgio para os calvinistas perseguidos na França, além é claro de promover a evangelização do novo mundo.

Em 10 de março de 1557, os protestantes franceses celebraram o primeiro culto evangélico do Brasil e no dia 21 de março celebraram a primeira Ceia do Senhor. Todavia, pouco tempo depois, Villegaignon entrou em conflito com os calvinistas acerca dos sacramentos e os expulsou da pequena ilha em que se encontravam.

Alguns meses mais tarde, os colonos reformados embarcaram de volta à França. Quando o navio ameaçou naufragar por excesso de passageiros, cinco deles resolveram regressar ao Brasil se sacrificando em favor dos outros que além da fome, sofriam com a possibilidade de naufrágio.

A história conta que assim que chegaram em terra foram presos: Jean du Bordel, Matthieu Verneuil, Pierre Bourdon, André Lafon e Jacques le Balleur.

Os prisioneiros pressionados por Villegaignon, foram obrigados a professar por escrito sua fé, no prazo de 12 horas, respondendo a uma série de perguntas que lhes foram entregues. Eles assim o fizeram, escrevendo a primeira confissão de fé na América, sabendo que com ela estavam assinando a própria sentença de morte. Essa maravilhosa declaração de fé ficou conhecida como a Confissão de Fé da Guanabara (1558).

Em seguida, como previsto, os três primeiros foram mortos e Lafon, o único alfaiate da colônia, teve a vida poupada. Os mártires do evangelho fluminense foram enforcados e seus corpos atirados de um despenhadeiro. Balleur fugiu para São Vicente, em São Paulo, onde foi preso e levado para Salvador (1559-67), sendo mais tarde enforcado no Rio de Janeiro.

Quase 100 anos depois, os holandeses criaram a Companhia das Índias Ocidentais com o objetivo de conquistar e colonizar territórios nas américas, especialmente uma rica região açucareira: o Nordeste do Brasil.

Em 1624, os holandeses tomaram Salvador, a capital do Brasil, mas foram expulsos no ano seguinte. Finalmente, em 1630 eles tomaram Recife e Olinda e depois boa parte do Nordeste. Neste período, João Maurício de Nassau-Siegen, que governou essa região entre 1637 a 1644, concedeu uma medida de liberdade religiosa aos residentes católicos e judeus.

Sob os holandeses, a Igreja Reformada era oficial. Foram criadas vinte e duas igrejas locais e congregações, dois presbitérios (Pernambuco e Paraíba) e até mesmo um sínodo, o Sínodo do Brasil (1642-1646). Mais de cinquenta pastores ou pregadores serviram essas comunidades. A Igreja Reformada realizou uma admirável obra missionária junto aos indígenas. Além de pregação, ensino e beneficência, foi preparado um catecismo na língua nativa. Outros projetos incluíam a tradução da Bíblia e a futura ordenação de pastores indígenas. Em 1654, após quase dez anos de luta, os holandeses foram expulsos, transferindo-se para o Caribe.

Desde então, não se sabe de relatos de cultos protestantes no Brasil. No entanto, com a chegada da família real às terras tupiniquins e com a abertura dos portos as nações amigas, as confissões protestantes começaram paulatinamente a chegar ao país. Os anglicanos chegaram em 1811, os luteranos em 1824, os congregacionais em 1855, os presbiterianos em 1859, e os batistas em 1871. Todavia, em virtude da Constituição de 1824, outorgada por D. Pedro I, que afirmava ser o catolicismo romano a religião oficial do Brasil, os protestantes não possuíam direito a cultos públicos em língua portuguesa. Além, é claro, de não terem permitidos a construção de templos com aparência religiosa. Já no governo de Dom Pedro II, mesmo o imperador possuindo uma grande simpatia pelos protestantes, não era nada fácil afirmar publicamente a fé nos pressupostos cristãos.

Com a Proclamação da República, o Estado brasileiro deixou oficialmente de ser Católico Romano permitindo assim com que os protestantes tivessem direito a culto. Todavia, como não poderia deixar de ser, a maioria da população ainda desenvolvia um significativo preconceito para com aqueles que se diziam cristãos protestantes.

A consequência direta disso foi a aniquilação de inúmeras templos evangélicos que, de forma covarde, foram destruídos pelo fogo. Dentre estes, encontra-se a 1ª Igreja Batista de Niterói, que em 14 de abril de 1901, teve seus móveis, púlpito, pertences e diversos utensílios queimados em plena rua, além de sua sede destruída.

Durante a primeira metade do século 20, os crentes em Jesus foram estigmatizados e denominados como hereges, sofrendo, por conseguinte, ofensas morais, nas quais atributos pejorativos lhes foram destinados. Junte-se a isso, o fato de que muitos, por causa da sua crença, sofreram no corpo agressões físicas.

Na segunda metade do século 20, a perseguição se deu de forma velada mediante os meios de comunicação que a todo custo vendiam à sociedade brasileira a imagem de uma Igreja burra, ignorante e manipuladora da fé alheia. Nessa perspectiva, tornou-se comum encontrarmos na TV, rádio, cinema e internet, acintes e deboches dos mais variados possíveis, cujo objetivo final é a desmoralização de todos aqueles que professam sua fé em Jesus.

Nos dias atuais tem crescido a olhos vistos o conceito de que evangélicos devem ficar restringidos às suas reuniões e templos, sendo impedidos assim, de divergirem dos conceitos e valores de uma sociedade secularista, absorta em pecado e absolutamente antagônica àquilo que a Bíblia prega e defende. Nessa perspectiva muitos tem vociferado ataques contra a fé evangélica tentando a todo custo empurrá-la para ostracismo onde o seu comportamento deve ser marcado efetivamente pelo silêncio. Para piorar a situação, as manifestações públicas nas Redes Sociais contra os evangélicos, tem feito com que pastores e religiosos acendam a “luz vermelha” quanto a possibilidade de uma nova e mais severa onda de perseguição aos evangélicos.

Na semana passada, por exemplo, um professor da Universidade Federal Fluminense, ao comentar sobre a renúncia de Evo Morales na Bolívia, afirmou categoricamente que os evangélicos bolivianos eram fascistas e que, portanto, precisavam ser assassinados. Outrossim, nas últimas semanas as redes sociais foram inundadas por textos preconceituosos onde o foco central foram os evangélicos, os quais segundo seus articuladores afirmaram, precisam ser calados.

Infelizmente, para a nossa tristeza, inúmeros comentários foram publicados afirmando que devido ao fascismo, os evangélicos precisavam ser banidos. Até mesmo um conhecido “pastor” esquerdista chegou a afirmar que tanto católicos carismáticos como evangélicos são a maior ameaça enfrentada atualmente pela América Latina. O dito “pastor” chegou a insinuar que o problema vivenciado pelo Brasil se deve aos evangélicos. Senão bastasse isso houve gente dizendo que os países democráticos deveriam proscrever os evangélicos porque eles estão sempre do lado do mal.

Aliás, é interessante perceber que aqueles que defendem a tolerância são os mais intolerantes. Basta por exemplo que alguém pense diferente deles, que partem para a agressão. Aliás, esquerdistas amam falar em tolerância. Em seus simpósios, congressos e conferências é comum encontrá-los dissertando sobre o tema, afirmando a necessidade de exercer paciência e benevolência com aqueles que deles divergem. Entretanto, basta com que alguém os critique, ou discorde do seu modo de pensar, que os tolerantes se transformam em intolerantes desejando até mesmo o fim da fé evangélica num país.

Ora, a Constituição de 1988 nos garante liberdade de fé e religião. O artigo 5º da Carta Magna diz que “É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. Contudo, ao que parece, muita gente, se possível, extirparia da constituição brasileira o artigo em questão, estabelecendo assim um Estado anárquico e desprovido dos princípios e valores cristãos, cujo fundamento tem servido de base para a democracia, o estado democrático de direito, a paz, a harmonia, bem como os valores de uma sociedade mais justa e equânime.

Por fim afirmo que defender o banimento do cristianismo e seus valores é promover o fim da sociedade ocidental. Digo mais: A liberdade religiosa tem um papel crucial na manutenção da democracia nos estados modernos, isto porque, existe uma relação simbiótica e umbilical entre liberdade religiosa e a manutenção de um estado democrático que respeita a liberdade individual. Portanto, destruí-la significa em outras palavras por fim a tudo aquilo que conhecemos como democracia, direitos e liberdade.

Renato Vargens é pastor sênior da Igreja Cristã da Aliança em Niterói, no Rio de Janeiro e conferencista. Pregou o evangelho em países da América do Sul, do Norte, Caribe, África e Europa. Tem 24 livros publicados em língua portuguesa e um em língua espanhola. É também colunista e articulista de revistas, jornais e diversos sites protestantes.
* Este texto reflete a opinião do autor e não, necessariamente, a do Pleno.News.
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